terça-feira, 31 de março de 2009

Lei das Execuções Penais

Lei das Execuções Penais

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7210.htm

LIVRAMENTO CONDICIONAL

LIVRAMENTO CONDICIONAL

Encontramos na internet um excelente trabalho, segundo consta, seria obra de André Ricardo de Oliveira Rios, e pela clareza e didática com que o assunto foi tratado, reproduzimos em nosso blog.

Livramento condicional

CONCEITO: Livramento condicional é a liberdade antecipada, mediante certas condições, conferida ao condenado que já cumpriu uma parte da pena imposta a ele.

No livramento o condenado só alcança esse benefício no curso da execução, tendo ele cumprido uma parcela da pena que lhe foi imposta. Diferente do “SURSIS” quando o condenado não chega sequer a iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade.

O SURSIS em regra é concedido na sentença e o recurso cabível é a apelação, sendo que o
livramento é concedido pelo Juízo da execução, cabendo de sua decisão o recurso de agravo de execução.

REQUISITOS

Sua concessão se faz com preenchimento de uma série de requisitos objetivos e subjetivos, sendo os primeiros relativos à pena imposta e a reparação do dano. Os segundos relacionam-se com o lado pessoal do condenado (subjetivo).

SÃO QUATRO OS REQUISITOS OBJETIVOS:

Primeiro a pena deve ser privativa de liberdade (reclusão, detenção e prisão simples)

Segundo é que a pena concreta deve ser igual ou superior a 2 anos de prisão, mesmo tratando-se de Contravenção Penal. Mesmo as penas de infrações diversas, devem ser somadas, mesmo em processos distintos, para efeito da concessão do benefício (art. 84 CP)

Terceiro é que exista o cumprimento de mais da metade da pena, se o condenado for reincidente em crime doloso, e de um terço se não for reincidente em crime doloso e tiver bom antecedente (livramento condicional especial). Existe o caso do condenado do não reincidente em crime doloso, mas portador de maus antecedentes, que ao ver de muitos de só cumprir somente um terço da pena. Diante da omissão da lei, a dúvida deve ser resolvida em favor do condenado.

Nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, exige-se o cumprimento de mais de dois terços da pena, se o apenado não for reincidente nessas penas (livramento condicional qualificado). O reincidente específico em crimes dessa natureza está proibido de obter o livramento condicional.

Por fim, o último requisito é a reparação do dano causado pela infração, (salvo quando efetiva impossibilidade de faze-lo) esse requisito acaba sendo “letra morta” porque na prática isso não acontece.

SÃO QUATRO OS REQUISITOS SUBJETIVOS:

Primeiramente é o comportamento carcerário satisfatório. Não se confunde com bom comportamento, mas sim, com comportamento satisfatório. São diversos fatores que
caracterizam essa conduta, como atestado de conduta carcerária, laudo criminológico, etc; podem comprovar o comportamento satisfatório.

O segundo é o bom desempenho em trabalho que lhe foi atribuído. Se devido à deficiência
do presídio nenhum trabalho for incubido ao preso, esse requisito fica prejudicado.

O terceiro é aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto. A lei diz
sobre aptidão, não em proposta real de emprego, o preso deve saber desempenhar certo
ofício.

O quarto é a constatação de condições pessoais que façam presumir que o preso não voltará
a delinqüir. Essa condição só existe aos crimes dolosos, cometidos com violência ou grave
ameaça à pessoa (estupro, roubo, homicídio) não exigido aos demais crimes. Com isso
busca-se não conceder tal benefício para condenados que apresentem periculosidade.
Usando de perícia psiquiátrica para determinar esse diagnóstico.

PROCESSAMENTO DO PEDIDO DE LIVRAMENTO

O pedido é dirigido ao juízo de execução, podendo ser impetrado pelo sentenciado, parente,
cônjuge, diretor do estabelecimento penal e Conselho Penitenciário. Não é preciso a necessidade de advogado. O juiz deve antes de decidir, colher a manifestação do Promotor de Justiça e do conselheiro penitenciário, sob pena de nulidade. Conforme reza o art. 131 da LEP, não há mais necessidade de ouvir o diretor do estabelecimento carcerário, estando, pois revogado o art.714 do CPP.

Deve o juiz fixar prazo para o Conselho penitenciário emitir seu parecer, enviando eu a demora possa prejudicar o sentenciado. Da decisão que concede ou rejeita o livramento condicional é cabível o agravo de execução.

PERÍODO DE PROVAS E CONDIÇÕES

O período de prova no livramento condicional é integrado pelo resto da pena, tendo inicio o
período de prova com a audiência admonitória, que é realizada no estabelecimento onde o
preso cumpre a pena (art. 137 da LEP). Sendo a audiência presidida e marcada pelo presidente do conselho Penitenciário ou membro por ele designado, ou pelo Juiz (inciso I do art.137 da LEP)
Na audiência, a sentença será lida ao liberando, na presença dos demais condenados. Após a leitura, o liberando declarará de aceita as condições, caso não aceite, fica sem efeito o livramento, ao menos se o Juiz queira altera-las. Se aceitar o livramento o liberando recebe uma caderneta com sua identificação e as condições impostas (art. 138 da LEP) .

São condições legais, isso é, obrigatórias :

a) Obter ocupação lícita, dentro de um prazo razoável, caso seja apto ao trabalho. Essa
expressão “ocupação lícita” compreende cursos técnicos, não somente trabalho. Sendo
deficiente físico essa condição não tem validade.

b) Comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação. Cabendo ao juiz fixar o intervalo dessa
comunicação, que na maioria das vezes costuma ser mensal.

c) Não mudar do território da comarca do juízo da execução, sem prévia autorização deste.
Portanto a lei não fala de mudança de residência, mas de comarca.

Pode o Juiz , além dessas condições obrigatórias, fixar as condições judiciais (art. 132 da
LEP):

a) não mudar de residência sem comunicar ao Juiz e á autoridade incumbida de da
observação cautelar e de proteção;

b) recolher á habitação em hora fixada;

c) proibição de freqüentar determinados locais.

Existe a possibilidade de outras condições judiciais adequadas ao fato e á situação do
liberado.Pode o tribunal que conceder a liberação em grau de recurso, fixar as condições a
critério do tribunal, podendo ser fixadas pelo juízo da execução( art.159 da lei de Execução
Penal).

REVOGAÇÃO OBRIGATÓRIA DO LIVRAMENTO (ART. 86)

São duas as causas de revogação obrigatória do livramento condicional.

A primeira ocorre quando o liberado é condenado a pena privativa de liberdade em
sentença irrecorrível, por crime cometido no período da vigência do beneficio. Produzindo
três efeitos:

a) Não se computa na pena o tempo que esteve solto.

b) Não se concederá, em relação à mesma pena, novo livramento (art. 88 do CP e 142 da
LEP). Para poder obter o livramento para a segunda pena, ele deverá cumprir a pena da
primeira condenação integralmente, pois no que diz respeito a esta lhe é negado novo
livramento.

c) O restante da pena cominada ao crime, sendo o livramento revogado, não pode somar-se
à nova pena para efeito de concessão de novo livramento.

A segunda causa de revogação obrigatória ocorre se o liberado venha a ser condenado a
pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível, por crime anterior. Entretanto os
efeitos não são tão drásticos. Exemplos:

a) O período de prova é computado como tempo de cumprimento de pena (art.141 da LEP)

b) É possível a concessão de novo livramento desde que o condenado tenha cumprido a
metade ou um terço, conforme seja ou não reincidente em crime doloso, da soma do tempo
das duas penas (art. 141 da LEP).

REVOGAÇÃO FACULTATIVA (art. 87)

São duas as hipóteses de revogação facultativa:

A primeira ocorre quando o liberando deixa de cumprir qualquer das condições constantes
da sentença.

Caso o juiz opte pela revogação os efeitos serão os seguintes:

a) Não se computa na pena o tempo que o condenado esteve solto.

b) Não se concederá, em relação à mesma pena, novo livramento.

A segunda ocorre se o liberando for condenado por crime ou contravenção, a pena que não
seja privativa de liberdade. Essas tais deliberações dão o ensejo à revogação facultativa.
Os efeitos na hipótese de crime ou contravenção cometidos durante o período de prova, são
os seguintes:

a) não se computa na pena o tempo em que o condenado esteve solto;

b) não se concederá em relação à mesma pena novo livramento.

Sendo crime ou contravenção cometido antes de período de prova, computa-se na pena o
tempo em que o réu esteve solto, permitindo ainda novo livramento condicional em relação
ao restante da pena.

Nos casos de condenação à pena privativa de liberdade (prisão simples) em razão de prática
de contravenção, não é causa de revogação obrigatória nem facultativa.

PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE PROVA

Prorroga-se o período de prova, nos casos em que o liberado estiver sendo processado por
crime cometido durante a vigência do livramento. Enquanto a pena não passar em julgado a
sentença o juiz não poderá extinguir a pena, prorrogando o período de prova até o trânsito
da sentença em julgado.

Transitada em julgado a pena, pode ocorrer as seguintes hipóteses:

a) O réu é absolvido. Nesse caso, o livramento condicional é extinto.

b) O réu é condenado por contravenção, a pena de prisão simples.

c) O réu é condenado a pena privativa de liberdade por crime doloso. Nesse caso, o livramento é obrigatoriamente revogado.

d) O réu é condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade.

EXTINÇÃO DA PENA

Expirando o prazo do livramento sem revogação ou prorrogação, considera-se extinta a
pena privativa de liberdade. Sendo meramente declaratória a decisão que decreta a extinção
da pena.

Antes de decretar a extinção o juiz deve ouvir o Ministério Público.

LIVRAMENTO CONDICIONAL EM FAVOR DE ESTRANGEIRO

O princípio da Isonomia (CF, art.5 caput) resguarda o estrangeiro residente no Brasil.
Podendo assim, obter o Livramento Condicional, a menos que um decreto do Presidente da
República, determine a sua expulsão.

O estrangeiro de passagem no Brasil, não pode obter “sursis” nem livramento condicional,
pois está proibido de exercer atividade honesta e remunerada, condição obrigatória do
livramento.

Bibliografia:

Direito Penal, parte geral: volume1/ Flavio Augusto Monteiro de Barros. – São Paulo:
Saraiva, 1999.

Código Penal – Luiz Flavio Gomes – Revista dos Tribunais, RT 2000.

André Ricardo de Oliveira Rios, Quarto anista de Direito, trabalhou no jurídico do banco
Itaú, na Prefeitura de São Paulo e na Secretaria da Juventude, Esporte e Lazer de São Paulo.
Desenvolve seus estudos com ênfase na área Penal.

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http://www.gmadvogados.com.br/

VALTER MACIEL FILHO
OAB/RS 30.586

segunda-feira, 30 de março de 2009

MORADOR AGREDIDO FISICAMENTE AO ENTRAR EM SEU CONDOMÍNIO RECEBE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

Morador agredido fisicamente ao entrar em seu condomínio recebe danos morais

A 9ª Câmara Cível do TJRS danos morais a morador que foi espancado por vigias noturnos ao tentar entrar no prédio em que residia. O valor de R$ 5 mil reais deverá ser pago, solidariamente, pela Empresa de Segurança MSP e pelo condomínio Itatiaia.

O demandante alega que sofreu agressões físicas dos vigias do condomínio Itatiaias, localizado no bairro Jardim Leopoldina, em Porto Alegre. O morador, entregador de pizza, ao chegar do trabalho de moto, durante a madrugada, estava sem o controle eletrônico do portão. Os seguranças do local lhe negaram a entrada. O portão foi aberto por uma moradora, que ouviu a discussão e se prontificou a abrir o portão. Entretanto, assim que entrou no prédio, o rapaz foi agredido pelos seguranças.

As rés alegaram que o morador agiu com imprudência ao não se identificar na portaria do prédio, reagindo com violência e descontrole aos pedidos dos vigias, jogando a moto contra o portão de acesso do prédio, danificando-a.

Danos morais

O Desembargador Odoné Sanguiné, relator, observou que os vigias não poderiam ter agido da maneira como procederam. “ Os funcionários da empresa de segurança podiam ter buscado junto ao autor a sua identificação para que entrasse no prédio, o que não provocaria a situação de confusão e constrangimento que se seguiu à não abertura do portão no momento em que solicitado”, analisou.

Como não pode ser provado se o autor fazia uso da sua motocicleta para realizar a função de entregador de pizza, nem de que havia deixado de lucrar com a situação, não foi concedido o pagamento de lucros cessantes, que também havia sido pleiteado.

Acompanharam o voto as Desembargadoras Marilene Bonzanini Bernardi e Iris Helena Medeiros Nogueira.

Para ler a íntegra da decisão, acesse abaixo o número do processo:

Proc.70026912550

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VALTER MACIEL FILHO
OAB/30.586


AGORA LEIA O ACÓRDÃO

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. danos morais. AGRESSÕES FÍSICAS PRATICADAS PELOS VIGILANTES DO CONDOMÍNIO EM QUE RESIDIA O AUTOR. EXCESSO CARACTERIZADO. dever de indenizar configurado.
1. RESPONSABILIDADE CIVIL. O agir ilícito da EMPRESA DE SEGURANÇA MSP, consubstanciado na conduta culposa de seus vigilantes através do excesso praticado contra o autor, imotivadamente, desbordando do que seria esperado naquelas circunstâncias; e do CONDOMÍNIO ITATIAIA, ao escolher tal empresa para cuidar da segurança dos condôminos (conforme o contrato de prestação de serviços colacionados aos autos), caracteriza conduta ilícita, existindo também o nexo da causalidade entre o ato e o prejuízo causado ao patrimônio moral do autor.
2. DANO MORAL. Se, de qualquer forma, o autor estivesse alterado ou nervoso no momento do ingresso no condomínio após o portão ter sido aberto por outro morador (em face da negativa em fazê-lo por parte dos vigias), entendo que os seguranças agiram de forma excessiva e desproporcional em relação ao demandante e em frente aos demais moradores. Não se ignora que a contratação de empresas de vigilância em prédios residenciais é cada vez mais comum em face dos problemas decorrentes da falha do sistema de segurança pública. Contudo, o controle exercido pelos vigias, nessas circunstâncias, não deve desbordar do razoável e do proporcional, mormente quando se está diante de um morador que tentava ingressar no prédio impossibilitado pelo fato de não portar o aparelho de controle eletrônico necessário para tanto. É inequívoco, diante das circunstâncias, portanto, o abuso no exercício do poder de vigilância por parte dos funcionários da empresa de segurança ora demandada, que podiam ter buscado junto ao autor a sua identificação para que entrasse no prédio – o que não provocaria a situação de confusão e constrangimento que se seguiu à não abertura do portão no momento em que solicitado pelo demandante; de qualquer sorte, desarrazoado agredi-lo.
3. QUANTUM INDENIZATÓRIO. A indenização por dano moral deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado.
4. JUROS DE MORA. Na hipótese de reparação por dano moral, cabível o início da contagem a partir da fixação do quantum indenizatório, é dizer, a contar do julgamento no qual foi arbitrado o valor da condenação.
5. CORREÇÃO MONETÁRIA. A correção monetária não constitui um acréscimo, e sim mera atualização da moeda, razão pela qual deve incidir a partir da fixação do quantum devido, é dizer, a partir do julgamento, consoante recente entendimento consolidado no verbete nº. 362 da Súmula do Eg. Superior Tribunal de Justiça.
6. LUCROS CESSANTES NÃO COMPROVADOS. Não consta dos autos provas que autorizem concluir que o autor, a despeito de ser motociclista, fazia uso da sua motocicleta para realizar a função de entregador de pizza, nem tampouco há provas no sentido do que, efetivamente, teria deixado de lucrar – por efeito direto e imediato do ato ilícito praticado pelas rés – nos termos dos artigos 402 e 403 do Código Civil, razão pela qual não procede a inconformidade com o não acolhimento do pedido de condenação ao pagamento de lucros cessantes.
7. Sucumbência redistribuída.
APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

Apelação Cível

Nona Câmara Cível
Nº 70026912550

Comarca de Porto Alegre
EVERTON EIDELWEIN CASTANHO

APELANTE
EMPRESA DE SEGURANCA MSP

APELADO
CONDOMINIO ITATIAIA

APELADO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, as eminentes Senhoras Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (Presidente e Revisora) e Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi.
Porto Alegre, 18 de fevereiro de 2009.

DES. ODONE SANGUINÉ,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Odone Sanguiné (RELATOR)
1. Trata-se de apelação cível interposta por EVERTON EIDELWEIN CASTANHO, contra sentença das fls. 193-197, nos autos de ação indenizatória por danos morais e materiais movida em face da EMPRESA DE SEGURANÇA MSP e CONDOMÍNIO ITATIAIA, que julgou parcialmente procedente os pedidos constantes da inicial, condenando os demandados ao pagamento de (i) R$ 180,00, a ser acrescido de correção monetária pelo IGP-M, a contar da data do cupom fiscal da fl. 35, mais juros moratórios de 12% ao ano, a partir da citação; (ii) 30% das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 200,00, conforme o art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, já procedida à compensação. Em relação ao demandante, restou suspensa a exigibilidade de tais verbas, em razão da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita (fl. 43).
2. EVERTON EIDELWEIN CASTANHO (fls. 200-215), em suas razões recursais, pugnando pela condenação dos réus ao pagamento de indenização a título de danos morais e lucros cessantes, argumenta que (i) é de fato notório que, para ser entregador de pizza, de carteira assinada ou não, o próprio veículo (moto) é seu instrumento de trabalho; (ii) restou impossibilitado pelos danos físicos de trabalhar; (iii) os danos morais experimentados pelo autor, em razão da agressão física sofrida, carecem de comprovação, uma vez que se constituem in re ipsa. Requer a redistribuição dos ônus sucumbenciais (quanto às custas processuais) e majoração da verba honorária fixada.
3. Intimada a parte ré (fl. 217), somente o CONDOMÍNIO ITATIAIA apresentou contrarrazões (fls. 219-220), pugnando pela manutenção da sentença .

Subiram os autos e, distribuídos, vieram conclusos.

É o relatório.
VOTOS
Des. Odone Sanguiné (RELATOR)
Eminentes colegas:

4. Cuida-se de apelação cível interposta por EVERTON EIDELWEIN CASTANHO, contra sentença das fls. 193-197, nos autos de ação indenizatória por danos morais e materiais movida em face da EMPRESA DE SEGURANÇA MSP e CONDOMÍNIO ITATIAIA, que julgou parcialmente procedente os pedidos constantes da inicial, condenando os demandados ao pagamento de (i) R$ 180,00, a ser acrescido de correção monetária pelo IGP-M, a contar da data do cupom fiscal da fl. 35, mais juros moratórios de 12% ao ano, a partir da citação; (ii) 30% das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 200,00, conforme o art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, já procedida à compensação. Em relação ao demandante, restou suspensa a exigibilidade de tais verbas, em razão da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.

5. Compulsando os autos (fls. 02-09), verifica-se que o requerido é morador do Condomínio ora demandado e que, na madrugada do dia 10/07/2005, teve dificuldades para ingressar no local em que residia em razão da conduta dos vigias, funcionários da segunda ré (EMPRESA DE SEGURANÇA MSP), que não abriam o portão para sua entrada – já que estava sem o controle eletrônico que possibilitava o livre acesso. Ao conseguir entrar no Condomínio, conforme relata, foi agredido pelos seguranças, sofrendo, por tal motivo, lesões corporais. Além disso, foi danificado o seu veículo de condução (uma moto) – razão pela qual ajuizou a presente demandada, postulando a condenação dos réus ao pagamento de indenização a título de danos materiais (consubstanciados em danos na moto e em lucros cessantes), bem como danos morais.

Examine-se.

a) Responsabilidade civil

6. A questão de fundo cinge-se à verificação da ocorrência de danos morais, bem como lucros cessantes, supostamente experimentados pelo demandante, advindos de agressões físicas e morais perpetradas pelos vigias do condomínio em que residia à época dos fatos.

7. O autor, na exordial, afirma que sofreu agressões físicas dos vigias do condomínio residencial em que morava quando, ao chegar do trabalho, durante a madrugada, não teve permitida sua entrada no prédio, nem atendidos os seus pedidos de abertura do portão eletrônico pelos seguranças.

8. A parte ré, a seu turno, refuta os argumentos lançados na exordial, afirmando que o autor procedeu com imprudência ao não se identificar na portaria do prédio, reagindo com violência e descontrole aos pedidos dos vigias, jogando, inclusive, a sua moto contra o portão de acesso ao prédio, danificando-a.

9. Ora, é fato incontroverso nos autos (i) que o autor é proprietário de uma moto “Honda/CG 125 Titan, ano/modelo 1997, placa IGD – 7407” (fl. 16); e (ii) que o demandante tentou ingressar no Condomínio em que residia, tendo sido impossibilitado – uma vez que os vigias não abriram o portão de entrada. O ponto controvertido refere-se à prática (ou não) pelos funcionários da EMPRESA DE SEGURANÇA MSP, ora demandada, de agressão contra o autor, quando esse logrou êxito em ingressar no Condomínio somente após um dos moradores ter acionado o portão eletrônico.

10. Analisando-se o caderno probatório coligido nos autos, conclui-se pela ilicitude da conduta dos funcionários da EMPRESA DE SEGURANÇA MSP, ora ré. A condenação necessita de um juízo de certeza e segurança sobre os pressupostos inerentes à sua responsabilização civil, o que ocorre no caso em apreço.

A teor do Boletim de Ocorrência das fls. 38-39, os fatos assim ocorreram: “relata o comunicante que ao chegar com sua moto em frente ao prédio onde mora, buzinou, acelerou e gritou para a vigilância abrir o portão [...]; que os vigilantes do condomínio que têm o controle magnético do portão não abriram para o comunicante entrar no pátio do prédio, [...]. Com a insistência do comunicante, para entrar, uma vizinha compareceu e abriu o portão, onde o comunicante entrou no pátio. Nesta ocasião, dois vigilantes aproximaram-se do comunicante e lhe agrediram fisicamente nos braços, no pescoço e na cabeça com um bastão policial [...]”.

11. Certo é que há pequenas discrepâncias entre as versões da exordial e dos depoimentos orais, mas tais divergências não são capazes de derruir o cerne fático da controvérsia: o autor tentou ingressar no pátio do prédio em que residia, e foi impedido pelos vigias da empresa ora demandada, que não abriram o portão – mesmo portanto o equipamento necessário para tanto e sem, ao menos, proceder à identificação do autor, para que, ao constatar que se tratava de morador, permitir seu ingresso. De modo que, somente com a ajuda de uma moradora, o demandante conseguiu entrar no condomínio.

12. Assim, além das alegações da parte autora, há também os depoimentos testemunhais que confortam a circunstâncias centrais em que se desenrolou a confusão, marcada por agressões físicas que desbordam do mero dissabor comum à vida em sociedade, de onde é possível extrair um juízo de certeza acerca do ocorrido.

13. Nestes lindes, verifica-se que há prova suficiente de que a conduta dos funcionários da EMPRESA DE SEGURANÇA MSP foi inadequada, imoderada ou desproporcional. Corroborando tal conclusão, está o depoimento colhido da testemunha Sílvia Regina Probst, devidamente advertida e compromissada (fls. 134-137): “[...] ele vinha do trabalho [...], ele começou a buzinar que queria entrar [...] e os dois seguranças, eram duas pessoas, estavam do lado da guarita naquela noite e ele pediu: ‘Abre o portão para mim que eu to sem meu controle’. E eles não queriam abrir. ‘Pô, pelo amor de Deus, abre o portão porque eu vou acabar sendo assaltado’. E eles não queriam abrir. Quem abriu que eu vi foi uma vizinha minha do outro bloco, no momento que ele entrou ele parou em cima dos dois seguranças e perguntou: ‘Pô cara, porque tu fez isso comigo? Eu queria entrar’. Aí o cara... começaram meio a que bater, realmente ele perdeu um pouco do controle e o cara partiu, bateu primeiro como cassetete naquela parte da moto porque eu tava na janela e vi e aí ele desceu da moto, botou naqueles pezinhos, encostou, desceu da moto e foi... claro os dois discutiram né e o cara pegou ele pelo pescoço com o cassetete. Aí a vizinhança toda começou a gritar [...]”.

14. Corroborando a tese de que os vigias não poderiam ter agido da maneira como procederam – considerando que deveriam ter procurado identificar o autor, com o escopo de verificar se era ou não condômino do local, e também para que esse não ficasse exposto aos perigos e contratempos da rua àquela hora da madrugada – está o depoimento da mesma testemunha (fl. 135), afirmando que “acontecem outras coisas seguidas ali com essa empresa, infelizmente deixa muito a desejar, o pessoal não é qualificado, há pouco tempo atrás, uns dez dias, houve problema com uma menina chegando do trabalho, também por estar fechado o portão que deveria estar aberto [...] a menina foi baleada, e os seguranças não querem saber [...]”.

15. No mesmo sentido, a testemunha Jennifer (fl. 156) depôs, afirmando que “numa noite, eu e meu marido estávamos dormindo e escutamos gritos no portão da casa e o que me impressionou na verdade foi que a pessoa dizia: ‘Abre, por favor, abre [...]’ e não abriram, mas o que mais nos incomodou e eu me prontifiquei a vir é que eu vi o Everton apanhar de cassetete, com aqueles cassetetes dos seguranças que no caso estariam ali para fazer a segurança”. Destacando que o autor estava de capacete no momento em que entrou no prédio – o que teria evitado que o demandante fosse ainda mais lesionado pelos cassetetes dos seguranças (fl. 157).

Outrossim, e não se afastando das narrativas já feitas, está o depoimento de Esther da Silva (fl. 131): “[...] porque ele chegou para entrar no condomínio, tava sem o controle e pediu pro guarda abrir e falou assim: ‘Abre, abre, abre’. E os caras não abriram, eu tava assim olhando e eu não tava com o meu controle se não eu teria aberto porque eu conheço o rapaz, a gente conhece os condôminos [...]. Daí ele dizia: ‘Por favor, abre, abre’. E o cara ria e disse: ‘Não vou abrir, vai esperar se quiser’. [...] só que quando ele entra os dois guardas que estavam lá pegaram. Ele entra com a moto e eles dão de cassetete em cima da moto [...]. Cheguei lá tava um com o cassetete aqui... nele, ele babava, ela já tava sem fôlego [...]”.

Por conseguinte, tenho que a prova oral confere veracidade ao suporte fático do demandante.

16. Se, de qualquer forma, o autor estivesse alterado ou nervoso no momento do ingresso no condomínio após o portão ter sido aberto por outro morador (em face da negativa em fazê-lo por parte dos vigias), entendo que os seguranças agiram de forma excessiva e desproporcional em relação ao demandante e em frente aos demais moradores.

Não se ignora que a contratação de empresas de vigilância em prédios residenciais é cada vez mais comum em face dos problemas decorrentes da falha do sistema de segurança pública. Contudo, o controle exercido pelos vigias, nessas circunstâncias, não deve desbordar do razoável e do proporcional, mormente quando se está diante de um morador que tentava ingressar no prédio impossibilitado pelo fato de não portar o aparelho de controle eletrônico necessário para tanto.

17. É inequívoco, diante das circunstâncias, portanto, o abuso no exercício do poder de vigilância por parte dos funcionários da empresa de segurança ora demandada, que podiam ter buscado junto ao autor a sua identificação para que entrasse no prédio – o que não provocaria a situação de confusão e constrangimento que se seguiu à não abertura do portão no momento em que solicitado pelo demandante; de qualquer sorte, em hipótese alguma, poderiam tê-lo agredido – conforme demonstram os documentos médicos da fl. 41.

18. Portanto, tenho que o autor logrou êxito em comprovar a configuração dos requisitos indispensáveis à imputação de responsabilidade civil, visto que a abordagem excessiva e agressiva restou configurada, bem como o nexo da causalidade entre a referida conduta e os danos dela emergentes.

19. Por conseguinte, a humilhação decorrente da situação vexatória a que foi submetido, bem como as lesões decorrentes da agressão física perpetrada pelos funcionários da empresa de segurança ora ré – caracteriza dano moral que dispensa prova concreta.

20. O agir ilícito da EMPRESA DE SEGURANÇA MSP, consubstanciado na conduta culposa de seus vigilantes através do excesso praticado contra o autor, imotivadamente, desbordando do que seria esperado naquelas circunstâncias; e do CONDOMÍNIO ITATIAIA, ao escolher tal empresa para cuidar da segurança dos condôminos (conforme o contrato das fls. 51-55), caracteriza conduta ilícita, existindo também o nexo da causalidade entre o ato e o prejuízo causado ao patrimônio moral do autor.

Dito isso, passo à análise do quantum indenizatório a ser fixado a título de danos morais.

b) Dano moral: quantum

21. A indenização por dano moral deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado.

Assim se expressou Humberto Theodoro Júnior, conforme o qual “o mal causado à honra, à intimidade, ao nome, em princípio, é irreversível. A reparação, destarte, assume o feito apenas de sanção à conduta ilícita do causador da lesão moral. Atribui-se um valor à reparação, com o duplo objetivo de atenuar o sofrimento injusto do lesado e de coibir a reincidência do agente na prática de tal ofensa, mas não como eliminação mesma do dano moral.”[1].

22. Nesta linha, entendo que a condição econômica das partes, a repercussão do fato e a conduta do agente devem ser perquiridos para a justa dosimetria do valor indenizatório.
No caso, o autor, motociclista (fl. 19), que litiga sob o pálio da assistência judiciária gratuita (fl. 43), foi constrangido e agredido fisicamente pelos vigias do condomínio onde residia, quando tentava nele ingressar, durante a madrugada, na volta do trabalho .
De outro lado, a parte ré, é formada por um Condomínio residencial, localizado nas proximidades do bairro Jardim Leopoldina; e por uma empresa de segurança.
23. Ponderados tais critérios objetivos, tenho como suficiente o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título indenizatório por danos morais, acompanhado dos devidos consectários legais.
24. Ressalto, que no tocante aos juros moratórios, na hipótese de reparação por dano moral, entendo cabível o início da contagem a partir da fixação do quantum indenizatório, ou seja, a contar do julgamento no qual foi arbitrado o valor da condenação. Destaco que tal posicionamento não afronta o verbete da Súmula nº 54 do STJ. Ao revés, harmoniza-se com o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça (REsp 618940 / MA; Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro; Terceira Turma; julgado em 24/05/2005; DJ 08.08.2005 p. 302).
25. Quanto à correção monetária, o termo inicial da contagem deve ser a data do julgamento. Dessa forma, além de se ter o quantum indenizatório justo e atualizado, evita-se que a morosidade processual ou a demora do ofendido em ingressar com a correspondente ação indenizatória gere prejuízos à parte demandada, sobretudo, em razão do caráter pecuniário da condenação (STJ: REsp 618940 / MA; Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro; Terceira Turma; julgado em 24/05/2005; DJ 08.08.2005 p. 302.). Entendimento recentemente consolidado no verbete nº. 362 da Súmula do Eg. Superior Tribunal de Justiça, verbis: “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”.

c) Lucros cessantes

26. O autor, em suas razões de apelo, pugna pela condenação da parte ré ao pagamento de lucros cessantes, considerando a impossibilidade de utilizar sua motocicleta para trabalhar (já que é entregador de pizza), bem como em decorrência das agressões físicas que sofreu.

27. Ora, não consta dos autos provas que autorizem concluir que o autor, a despeito de ser motociclista (fl. 19), fazia uso da sua motocicleta para realizar a função de entregador de pizza, nem tampouco há provas no sentido do que, efetivamente, teria deixado de lucrar – por efeito direto e imediato do ato ilícito praticado pelas rés –, nos termos dos artigos 402 e 403 do Código Civil, razão pela qual não procede a inconformidade com o não acolhimento do pedido de condenação ao pagamento de lucros cessantes.

28. Logo, nego provimento ao apelo no ponto.

d) Verba honorária

29. O arbitramento dos honorários advocatícios observará, em ações como a presente, o grau de zelo profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, nos termos do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC.

30. Considerando tais parâmetros e a ocorrência de sucumbência recíproca, entendo adequado à presente hipótese condenar (i) o réu ao pagamento de 70% das custas processuais e honorários advocatícios no valor de R$ 700,00 (setecentos reais); e (ii) a parte autora ao pagamento do restante das custas processuais (30%) e verba honorária fixada em R$ 300,00, autorizada a compensação nos termos da Súmula nº. 306 do Eg. Superior Tribunal de Justiça. Quanto ao autor, fica suspensa a exigibilidade em face da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita (fl. 43).

31 Diante do exposto, dou parcial provimento ao apelo do autor, para condenar os réus, solidariamente, ao pagamento de indenização a título de danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).



Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (PRESIDENTE E REVISORA) - De acordo.
Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi - De acordo.

DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA - Presidente - Apelação Cível nº 70026912550, Comarca de Porto Alegre: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME"


Julgador(a) de 1º Grau: JORGE ALBERTO VESCIA CORSSAC
[1] A liquidação do dano moral, Ensaios Jurídicos – O Direito em revista, IBAJ – Instituto Brasileiro de Atualização Jurídica, RJ, 1996, vol. 2, p.509.

domingo, 29 de março de 2009

AFASTAMENTO DA EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE PASSIVA DA CDL - DEVER DE INDENIZAR - FALTA DE INTIMAÇÃO - INSCRIÇÃO ORIGINADA EM OUTRO ÓRGÃO

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO EM ÓRGÃO DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. POSSIBILIDADE DE DECISÃO MONOCRÁTICA.

AFASTAMENTO DA EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE PASSIVA DA CDL PARA RESPONDER POR INSCRIÇÃO ORIGINÁRIA DE OUTRO BANCO DE DADOS.

AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. ATO ILÍCITO. EXISTÊNCIA DE UMA ÚNICA INSCRIÇÃO. DANO MORAL. DANO IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO.

APELAÇÃO PROVIDA DE PLANO

Apelação Cível

Nona Câmara Cível

Nº 70028719862

Comarca de Cachoeirinha

MÁRCIO VARGAS DE SOUZA

APELANTE
CâMARA DE DIRIGENTES LOJISTAS DE PORTO ALEGRE - CDL

APELADO

DECISÃO MONOCRÁTICA
Vistos.

I- RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por MÁRCIO VARGAS DE SOUZA à sentença que examinando ação de indenização que move em desfavor de CDL - CÂMARA DE DIRIGENTES LOJISTAS DE PORTO ALEGRE, julgou extinto o processo, sem julgamento de mérito, forte no art. 267, VI, do CPC, por ilegitimidade passiva. Por fim, condenou o autor no pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios fixados em R$ 800,00 (oitocentos reais); contudo, suspendeu a exigibilidade de tais encargos em face da concessão do benefício da gratuidade judiciária.

Em suas razões recursais (fls. 71-6), o apelante sustenta a legitimidade passiva da ré. Aduz inobservância do art. 43, §2º, do CDC. Colaciona jurisprudência. Requer o provimento do recurso.

Certificou-se a ausência de contra-razões, fl. 79v.

Subiram os autos a esta Corte.

Vieram conclusos.

É o relatório.

II – FUNDAMENTAÇÃO

POSSIBILIDADE DE DECISÃO MONOCRÁTICA.

Inicialmente, cumpre esclarecer que o recurso comporta julgamento na forma do art. 557 do CPC, porquanto diz respeito à matéria com orientação jurisprudencial majoritária nesta Corte. Ademais, o tema já tem posição pacificada no Órgão Colegiado, bem como no 5º Grupo Cível, o que autoriza o relator apreciar o recurso na forma monocrática, haja vista que esta decisão terá resultado idêntico ao proferido pela Câmara e pelo Grupo.

AFASTAMENTO DA EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE PASSIVA DA CDL PARA RESPONDER POR INSCRIÇÃO ORIGINÁRIA DE OUTROS BANCOS DE DADOS.

Afasto a extinção do processo por ilegitimidade passiva da CDL para responder por inscrições de outros bancos de dados.

É que todos os cadastros que utilizam o Sistema de Proteção ao Crédito são interligados em uma rede de comunicação na qual o SPC BRASIL – Serviço Nacional de Proteção ao Crédito centraliza o cadastro nacional de inadimplentes, de todos os seus afiliados, no país. Isso o torna um cadastro único difundido para todos as entidades cadastradas, sendo tais registros tornados públicos também pela empresa ré, CDL Porto Alegre.

Assim, é de se ter que o fato da inscrição ter sido produzida por entidade diversa, mas conveniada, não lhe retira a legitimidade para responder à lide. Os débitos inscritos podem ser informados por qualquer dos associados ao SPC no país, estando estes disponíveis às pessoas também por meio da CDL Porto Alegre, razão pela qual se mostra a empresa ré legitimada para responder por eventuais danos causados pelo registro sem notificação, a qual é sua obrigação legal, e pela pretensão de cancelamento dos registros.

Nesse sentido, o entendimento do 5º Grupo Cível desta Corte:

EMBARGOS INFRINGENTES. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANOS MORAIS. LEGITIMAÇÃO PASSIVA. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA VERIFICADA. EXERCÍCIO REGULAR DE ATIVIDADE. DEVER DE REPARAR NÃO CONFIGURADO. É o CDL de Porto Alegre parte legítima para responder pelas inclusões efetuadas em seu sistema pelas empresas associadas, à medida que disponibiliza a consulta e divulgação das informações ali constantes.

(...)

REJEITADA A PRELIMINAR E DESPROVIDOS OS EMBARGOS INFRINGENTES. (Embargos Infringentes Nº 70019054311, Quinto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 18/05/2007).

Pelo exposto, afasto a extinção do processo por ilegitimidade passiva da ré.

MÉRITO.

No mérito, consigno que o autor está inscrito no banco de dados da ré por uma pendência financeira, fl. 23.

No caso, a demandada não comprovou o envio da notificação.

Este órgão fracionário, bem como o Grupo Cível do qual faz parte, tem se posicionado, da seguinte forma, em ações baseadas na suposta inobservância do dever cominado pelo § 2º do art. 43 do Código de Defesa do Consumidor: nos casos em que exista apenas uma dívida registrada, não comprovada a notificação, os danos são considerados in re ipsa, e a indenização não deve passar da casa dos R$ 1.000,00; existindo duas ou mais dívidas registradas, os danos necessariamente devem ser comprovados pelo suposto lesado, deixando de ser presumidos, casos em que a indenização não passará dos R$ 300,00; existindo inúmeras inscrições, a presunção e a comprovação da ocorrência de danos morais ficam prejudicadas, restando apenas ser julgada improcedente a demanda.

No caso, não há como afastar a responsabilidade da ré por ter efetuado o cadastro negativo de crédito sem providenciar a prévia notificação do consumidor.
Compulsando os autos verifica-se que existiu inscrição do nome do autor referente a uma única pendência financeira.

E não logrou a demandada demonstrar ter sido efetuada a notificação prévia do registro, o que permitiria ao devedor, quiçá, solver sua dívida ou enfrentá-la de maneira a evitar o cadastramento.

Concluo, diante do exposto, que a ré não cumpriu com seu dever legal.

O lançamento e a manutenção de nome em cadastro de inadimplentes é admitido desde que cumpridos determinados pressupostos, entre eles a existência de dívida pendente e a prévia notificação.

Os pressupostos ensejadores da responsabilidade civil estão presentes. O autor teve seu nome inscrito em órgão de restrição de crédito sem que lhe fosse enviada a notificação prévia exigida pelo artigo 43, § 2º do Código de Defesa do Consumidor.

O dano moral, no caso de existir apenas uma inscrição, resulta diretamente do registro não comunicado. As conseqüências danosas resultantes de ter o nome cadastrado em órgão de restrição de crédito são de todo conhecidas, e independem de ter concretamente atingido a esfera patrimonial da parte autora.

Trata-se de hipótese típica de dano in re ipsa. Provado o fato básico, provado está o dano, alicerce do dever de reparar. É o que se infere da convivência societária natural, que prima pelo respeito à dignidade do ser humano. Cabe ao autor, apenas, provar o fato básico e alegar a conseqüência natural.

Neste sentido, o entendimento pacífico do 5º Grupo Cível desta Corte, integrado por esta Câmara:

EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO CUMULADA COM PEDIDO DE CANCELAMENTO DE REGISTROS. INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR EM CADASTRO DE ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA, NOS TERMOS DO ART. 43, §2º, DO CDC. AÇÃO

1. O art. 43, §2º, do CDC, é expresso no sentido de determinar, necessariamente, que se proceda à comunicação prévia, de modo a que se viabilize, inclusive, o contraditório, não se tratando de mera formalidade anterior à inscrição nos cadastros. Como conseqüência da leitura da referida norma, dessume-se que ao implicado deve-se oportunizar o direito de contestar o apontamento, de modo prévio, a fim de que se minimize a possibilidade de ocorrência de danos injustificadamente.

2. A ausência de comprovação de notificação prévia, em ofensa ao disposto no art. 43, §2º, do CDC, justifica o acolhimento do pedido de danos morais. 3. Em se tratando de um único registro em nome do demandante, o dano moral é considerado `Damnum in re ipsa¿, prescindindo de comprovação da efetiva lesão, a qual se presume. EMBARGOS INFRINGENTES DESACOLHIDOS. UNÂNIME. (Embargos Infringentes Nº 70020834529, Quinto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 14/09/2007).

EMBARGOS INFRINGENTES. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. COMUNICAÇÃO PRÉVIA. AUSÊNCIA. ARTIGO 43, § 2º, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INOBSERVÂNCIA. ÚNICA ANOTAÇÃO EM NOME DO CONSUMIDOR. DANOS MORAIS CONFIGURADOS.

A comunicação ao consumidor a respeito da inscrição do nome nos registros de proteção ao crédito constitui obrigação do órgão responsável pela manutenção do cadastro. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Nos autos não há prova de que tenha havido prévia notificação, como determina o § 2º do artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor. Configurada a conduta contrária à lei, que, no âmbito da responsabilidade civil, gera o dever de indenizar. Presentes os pressupostos da responsabilidade civil, impõe-se a obrigação de indenizar. Demonstrada a ocorrência do fato gerador lesivo, desnecessária a prova da ocorrência do dano moral, em face da presunção in re ipsa de que é portador, ou seja, os resultados prejudiciais decorrem da própria ilicitude. A experiência indica que o registro do nome no cadastro de inadimplentes gera conseqüências negativas ao crédito, ao bom nome, à fama, à honra, em face da publicidade de que a informação se reveste. EMBARGOS INFRINGENTES DESPROVIDOS. UNÂNIME. (Embargos Infringentes Nº 70021177233, Quinto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 14/09/2007).

Diante disso, condeno a ré no pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 1.000,00 – seguindo os parâmetros já referidos -, a serem corrigidos, a partir desta decisão, pelo IGPM e pelo acréscimo de juros moratórios de 1% ao mês.

III- DISPOSITIVO

Por tais razões, dou provimento de plano à apelação para afastar a extinção do feito por ilegitimidade passiva e para condenar a ré no pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 1.000,00, a serem corrigidos, a partir desta decisão, pelo IGPM e pelo acréscimo de juros moratórios de 1% ao mês, com a inversão do ônus sucumbencial fixado na sentença.

Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2009.


Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi,
Relatora.

Dano Moral - SPC - Serasa - BACEN/CCF - Falta de comunicação

APELAÇÃO CÍVEL. INSCRIÇÃO EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO SEM PRÉVIA NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR (ART. 43, § 2º, DO CDC). CANCELAMENTO DA INSCRIÇÃO QUANDO IRREGULAR. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS MORAIS.

1. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ARQUIVISTA E NÃO DO CREDOR

para realizar a notificação ao consumidor. Segundo recente jurisprudência pacificada da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar recurso repetitivo (art. 453-C, do CPC) e também desta Câmara Cível, a comunicação ao consumidor sobre a inscrição de seu nome nos registros de proteção ao crédito constitui obrigação do órgão responsável pela manutenção do cadastro, isto é do arquivista, e não do credor, que apenas informa a existência da dívida. Aplicação do § 2º, do art. 43, do CDC.

2. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ARQUIVISTA POR CADASTROS ORIUNDOS DO CCF DO BANCO CENTRAL.

A 2ª Seção do STJ também pacificou o entendimento de que os órgãos mantenedores de cadastros restritivos possuem legitimidade passiva para as ações que buscam a reparação dos danos morais e materiais decorrentes de inscrição feita sem a prévia comunicação do devedor, mesmo quando os dados utilizados para a negativação são oriundos do cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos do Banco Central (CCF) ou de outros cadastros mantidos por entidades diversas (REsp 1.061.134/RS e REsp 1.062.336/RS, 2ª Seção do STJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 10/12/2008).

3. O arquivista, seja associação ou câmara de dirigentes lojistas (CDL), que utiliza banco de dados com inscrição de consumidor no cadastro de inadimplentes sem prévia notificação e divulga a existência de apontamentos em nome do devedor, ainda que tenha obtido a informação de terceiro órgão, responde solidariamente com a entidade responsável pela negativação, e é parte legítima passiva para responder à ação de cancelamento e de reparação de danos morais, pelas falhas decorrentes desse cadastro, nos termos do artigo 7º, parágrafo único, do CDC (AG 985172, rel. Min. Luiz Felipe Salomão).

4. INSCRIÇÃO DE CHEQUES SEM PROVISÃO DE FUNDOS PROVENIENTES DO CCF. NECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO PELO ARQUIVISTA.

Mesmo considerando que a inclusão do nome de correntista no Cadastro de Emitente de Cheques sem Fundos do Banco Central (CCF) obriga a instituição financeira a notificar previamente o emitente, a inexistência de surpresa por parte do consumidor diante do registro efetuado em banco de dados de inadimplentes nesta hipótese não é capaz de afastar a obrigação do arquivista no cumprimento da norma consumerista de ordem pública prevista no art. 43, § 2º, do CDC. Tal artigo legal não excepciona a obrigatoriedade de o arquivista proceder à comunicação prévia quando o consumidor for cientificado por outros meios de sua inadimplência. Assim, há necessidade de realizar a comunicação prévia, mesmo nos casos de cheques sem suficiente provisão de fundos.

5. CANCELAMENTO DOS REGISTROS. Ante a ausência de comprovação de notificação prévia, com relação ao registro relativo ao cheque sem provisão de fundos, em ofensa ao disposto no art. 43, §2º, do CDC, impende o acolhimento do pedido de cancelamento do registro em cadastros de restrição de crédito, efetuado sem que a parte autora tenha sido previamente comunicada, sem prejuízo de ulterior inscrição desde que cumprida tal formalidade legal.

6. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

6.1. FALTA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA

A 2ª Seção do STJ, também em regime de recursos repetitivos, pacificou o entendimento de que a ausência de prévia notificação ao consumidor da inscrição do seu nome em cadastro de restrição ao crédito é suficiente para caracterizar o dano moral.

6.2. EXISTÊNCIA DE INSCRIÇÕES ANTERIORES REGULARMENTE FEITAS EXCLUI O DEVER DE INDENIZAR

Porém, a mesma 2ª Seção do STJ pacificou o entendimento de que a ausência de notificação prévia para a inscrição do devedor nos órgãos de restrição ao crédito, quando já existentes outras inscrições anteriores, isto é, mais de um registro, regularmente feitas em nome do devedor, gera direito ao cancelamento da inscrição, mas não enseja o direito à indenização por dano moral decorrente da inscrição sem prévia notificação do nome do consumidor em cadastros de restrição ao crédito. A indenização perde a razão de ser, tendo em vista que o objetivo do art. 43, § 2º, do CDC, não é alcançado até porque não há a pretensão do devedor de pagar suas dívidas (REsp 1.061.134/RS e REsp 1.062.336/RS, 2ª Seção do STJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 10/12/2008).

7. Sucumbência redistribuída.

APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70028040020, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 30/12/2008)

quinta-feira, 26 de março de 2009

Homem é condenado por matar a facadas cão de rua

Homem é condenado por matar a facadas cão de rua

A Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais do Estado condenou homem que atraiu para a residência dele cão abandonado, pisou no pescoço para imobilizar o cachorro e o matou com diversas facadas. O delito de maus tratos a animais ocorreu na Linha São Roque, Município de São Marcos.

A relatora do apelo do réu, Juíza Ângela Maria Silveira, readequou, de ofício, a pena para 4 meses e 20 dias de detenção, que deve ser substituída por restritiva de direito, além de impor multa. Sendo a condenação inferior a seis meses, é impossível a substituição por prestação de serviços à comunidade. O Juiz responsável pela execução definirá qual será a pena restritiva de direito em substituição à privativa de liberdade.

O réu alegou não ter cometido o delito. Disse que a sogra e a vizinha, por não gostarem dele, o incriminaram.

De acordo com a magistrada, boletim de ocorrência, fotografia do animal morto e testemunhas comprovam que o réu cometeu o delito. Policial Militar que compareceu ao local informou que encontrou o cachorro morto, com mais de 10 perfurações, em cima de parreira. A sogra e vizinha do apelante afirmaram que o réu matou o cachorrinho de rua.

O Juizado Especial Criminal de São Marcos havia arbitrado a pena em 8 meses de reclusão, em regime semi-aberto, substituindo-a em prestação de serviços à comunidade. Também determinou pagamento de multa. A Turma Recursal readequou, então, a pena para 4 meses e 20 dias de detenção, a ser substítuida por restritiva de direito.

O delito de maus tratos a animais está previsto no artigo 32, § 2º, da Lei nº 9.605/98:

“Art. 32 – Praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 ano, e multa.
§ 2º - A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se ocorre morte do animal.”

Votaram de acordo com a relatora, os Juízes Laís Ethel Corrêa Pias e Volcir Antonio Casal.

Proc. 71002014553


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sábado, 21 de março de 2009

Justiça manda Banco de Brasília garantir 70% de salário de clientes endividados

Justiça manda BRB garantir 70% de salário de clientes endividados

O Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec) divulgou na tarde desta segunda-feira (16/03) ter obtido, neste ano, duas liminares e uma sentença da Justiça do Distrito Federal a favor de consumidores endividados que estavam tendo todo o salário consumido pelo desconto de dívidas com cheque especial , crédito consignado e outros tipos de empréstimo.

O ganho de causa – pelo menos na instância do DF – contemplou uma uma servidora pública que estava há cinco meses sem remuneração. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) ordenou que os termos do contrato dela fossem revistos e o valor das parcelas recalculado.

Os outros dois favorecidos com a liminar não recebiam salário há três e quatro meses. A dívida de um deles chega a R$ 70 mil. Em todos os três casos, o reú das ações é o Banco de Brasília (BRB) e os autores são funcionários públicos do governo do DF. O TJDF limitou o valor que pode ser cobrado dos servidores em 30% do salário de cada um – a maioria dos consumidores acredita que esse limite vale apenas para o empréstimo consignado, mas um limite é passível de aplicação à cobrança qualquer tipo de empréstimo contraído ou dívida, de acordo com o presidente do Ibedec, Geraldo Tardin. De acordo com ele, a Justiça já aceitou, em centenas de casos, os argumentos de que, quando a cobrança de uma dívida priva alguém do conteúdo integralmente de sua remuneração – ou da maior parte dela – há atentado contra o princípio constitucional da dignidade humana e mesmo aproprieção indébita. Tardin cita ainda o Código de Defesa do Consumidor, que garante ao consumidor vulnerável financeiramente o direito de recálculo e revisão da forma de pagamento de débitos.“No ano passado, ganhamos aproximadamente 100 ações do tipo. No momento, 80 correm na Justiça.

A maioria é de servidores públicos que contraíram outros débitos além do crédito consignado, muitos contraíram empréstimos para pagar outros empréstimos. Temos de 10 a 15 atendimentos por dia relativos a esse tipo de cobrança abusiva, e só não há mais porque quem não é servidor ou aposentado e não pega consignado muitas vezes não sabe que tem o direito de reclamar”, diz o presidente do Ibedec.

Agiotas.

A servidora da Secretaria de Saúde do Distrito Federal Maria de Fátima de Souza, 52 anos, afirma ter se habituado a tomar crédito no BRB desde que tornou-se funcionária pública, em 1981.

De acordo com Maria de Fátima, com o tempo a instituíção financeira passou a oferecer aos clientes outras formas de fazer gastos extras - cartão e cheque especial - e a servidora adquiriu o mau hábito de fazer uma dívida para cobrir outra.

"Há alguns anos tudo se complicou. O crédito consignado tomava parte do meu salário e eu usava cheque especial e cartão nas minhas despesas de rotina, então lá se ia mais um pedaço com cobrança e juros. Acabei ficando sem margem de crédito no cartão e no banco e recorri a agiotas", afirma ela, que diz que paga juros de 10% a 12% em empréstimos tomados junto a eles.

Há três meses, no entanto - a decisão favorecendo-a saiu em janeiro deste ano - Fátima passou a receber 70% de seu salário, o que dá cerca de R$ 1,5 mil mensais. "Estou começando a respirar", diz, aliviada. A funcionária afirma que terá "muita cautela" com crédito a partir de agora.

Decisões.

As decisões que beneficiaram os servidores do GDF que tinham dívidas junto ao BRB partiram da 6ª Vara de Sentença Pública do Distrito Federal (sentença) e da 7ª e 4ª Varas de Fazenda (liminares).

No caso da decisão proferida na 4ª Vara, o juiz Arnaldo Correia afirmou que há irresponsabilidade dos bancos no momento de conceder empréstimos. “Não tenho dúvida de que um dos grandes vilões que levam as pessoas ao endividamento são justamente as instituições financeiras, uma vez que fornecem mais crédito do que a pessoa tem possibilidade de pagar, além do que cobram juros elevadíssimos e ainda contam com o beneplácito dos legisladores”, afirmou.

O correiobraziliense.com.br entrou em contato com a assessoria de imprensa do Banco de Brasília. A instituição disse que divulgaria uma nota sobre as três decisões judiciais, mas ainda não se manifestou.

Esta notícia foi publicada no Correio Braziliense em abril de 2009.


Valter Maciel Filho
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quinta-feira, 12 de março de 2009

Município indenizará por morte de funcionário atropelado por trator

Município indenizará por mortede funcionário atropelado por trator

Em decisão unânime, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou o Município de Arroio do Tigre a indenizar cinco irmãos de homem que morreu em acidente de trabalho.

A vítima trabalhava retirando esterco de um depósito utilizando equipamento chamado “distribuidor”, que fica junto ao trator. O equipamento só funciona com o veículo ligado e parado.

No momento em que a máquina funcionava, o trator começou a se mover. O piloto correu e subiu para frear, mas se desequilibrou, caiu no chão e foi atropelado por uma das rodas. Chegou a ser internado, mas faleceu.

A defesa do Município alegou que a culpa foi da vítima que não puxou adequadamente o freio nem pôs um calço em suas rodas, submetendo-se assim a um risco desnecessário ao tentar subir no trator.

Em 1º Grau a ação foi julgada improcedente e os familiares apelaram ao Tribunal.

Para o relator do recurso, Desembargador Odone Sanguiné, a responsabilidade é do Município, que deveria ter disponibilizado mais um funcionário para auxiliar na tarefa, uma vez que o funcionamento do distribuidor dependia do motor ligado. Salientou também que cabe ao empregador provar que forneceu orientações e treinamento técnico de proteção necessários à eficaz segurança do funcionário.

O magistrado observou que testemunhas afirmaram que o motivo de o freio soltar pode ter ocorrido pela vibração do equipamento e que outro acidente já havia acontecido com a mesma máquina. A perícia técnica reconheceu que uma mera trepidação pode acionar caso o freio não esteja completamente puxado.

A indenização foi arbitrada em R$ 15 mil para cada um dos irmãos, a ser corrigida monetariamente pelo IGP-M e acrescida de juros de 12% ao ano.

Acompanharam o voto do relator o Desembargador Tasso Caubi Soares Delabary e a

Desembargadora Marilene Bonzanini Bernardi.

Proc. 70024688905

Notícia publicada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

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VALTER MACIEL FILHO
OAB/RS 30.586

Ex-sócio pode ter conta penhorada para pagar dívidas trabalhistas

Ex-sócio pode ter conta penhorada para pagar dívidas trabalhistas

Na ausência de recursos da empresa e dos atuais sócios, um ex-sócio da empresa Promodal Logística e Transportes Ltda. teve sua conta bancária penhorada para pagar dívidas trabalhistas de um empregado cuja relação de trabalho se deu à época em que ainda era sócio da empresa.

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o agravo de instrumento do ex-sócio e considerou correto o bloqueio (mediante penhora online, decidido com base na teoria da desconsideração da personalidade jurídica do devedor, segundo a qual, inexistindo bens da empresa executada e de seus sócios capazes de garantir o crédito objeto da execução, os ex-sócios respondem com o patrimônio próprio.

A história começou em fins de 2004, quando o empregado recorreu à Vara do Trabalho de Guarulhos (SP) para reclamar que foi demitido sem justa causa e sem receber as verbas rescisórias. Informou que foi contratado em maio de 1996 como motorista carreteiro na Tecnocargo – Transporte do Amazonas, sendo em seguida transferido para a Promodal, ambas do mesmo grupo econômico GPT.

Em julho de 2004, foi demitido com mais de 80 colegas.

A empresa foi condenada e, após várias tentativas de execução por meio de penhora de seus bens e de seus atuais empreendedores, o juízo determinou a penhora das contas do ex-sócio. O entendimento foi o de que a dívida correspondia ao período em que ele fez parte da sociedade e, assim, “usufruiu da prestação de serviços do autor”.

O antigo sócio se insurgiu contra a decisão. Alegou que não podia ser responsabilizado pela dívida, pois não pertencia mais ao grupo econômico, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região manteve a penhora. Recorreu, então, ao TST, por meio de agravo de instrumento.

O relator, ministro Lelio Bentes Corrêa, esclareceu que o ex-sócio somente passou a ser responsabilizado quando foi aplicada a teoria da desconstituição da personalidade jurídica, e nesse momento poderia ter se defendido por meio de embargos de terceiro e da interposição de agravo de petição.

Não caberia agora, portanto, a alegação de cerceamento de defesa e de violação constitucional.

O voto do relator foi seguido por unanimidade pelos demais ministros da Primeira Turma, sob o entendimento de que a desconsideração da personalidade jurídica do devedor foi bem aplicada, pois a “inexistência de bens da empresa, por si só, presume a irregularidade da gestão empresarial”. ( AIRR 2067/2004-311-02-40.2)(Mário Correia).

Esta matéria tem caráter informativo, sem cunho oficial.

Permitida a reprodução mediante citação da fonte

Assessoria de Comunicação Social Tribunal Superior do Trabalho

Tel. (61) 3314-4404

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VALTER MACIEL FILHO
OAB/RS 30.586

sexta-feira, 6 de março de 2009

Camelô que vende DVDs piratas comete crime de violação de direito autoral

Camelô que vende DVDs piratas comete crime de violação de direito autoral

Comete o crime previsto no art. 184, § 2º, do Código Penal, a pessoa que, com o intuito de lucro, expõe à venda diversos DVDs reproduzidos com violação dos direitos dos autores, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente.

Assim, a 4ª Câmara Criminal do TJRS manteve a decisão do Juízo da 1ª Vara Criminal de Carazinho que condenou mulher de 27 anos à época dos fatos. Em maio de 2008, a ré expôs à venda na banca 16 do camelódromo da cidade 301 CDs de música, 358 DVDs de jogos, 436 DVDs de filmes, e 11 discos de DVD-OKE conforme auto de apreensão. O fato foi presenciado por Policiais Civis em fiscalização de rotina, que encontraram os objetos.

Exame da Seção de Documentoscopia do Departamento de Criminalística do Instituto Geral de Perícias do Estado concluiu que os objetos apreendidos não eram autênticos por não apresentar as características dos respectivos padrões da indústria nacional e/ou internacional.

O Juiz de Direito Orlando Faccini Neto, de Carazinho, julgou procedente a denúncia oferecida pelo Promotor de Justiça Denílson Belegante. “A acusada possuía os objetos mencionados na denúncia na banca de camelô, e, assim, objetivava lucrar com a venda desses produtos que sabia serem falsificados”, afirmou o magistrado na sentença.

A respeito da tese defensiva pleiteando o reconhecimento do estado de necessidade, considerou o Juiz Faccini Neto que “ainda que a atividade fosse o único meio de sustento da acusada, não se pode dizer que a abstinência da venda dos produtos falsificados implicaria em prejuízo tal que levasse ela e sua família a condições indignas de vida”. E continuou: “Assim entendendo, permitir-se-ia a todos os desempregados que violassem a lei penal, cometendo delitos com o objetivo de obter a renda necessária à sobrevivência”.

Para o juiz de Carazinho, “há uma verdadeira incompatibilidade de valores, de forma que impossível admitir a ação da acusada, que lesionou, além do direito do autor, que licitamente sacrificou-se na produção da obra, o direito da sociedade, tendo em vista que o estado deixa de arrecadar tributos com a venda de produtos falsificados”.

E concluiu: “Ainda que fosse pessoa idosa, sem possibilidade de obter outro emprego não haveria de ser acolhida a tese, com maior razão ainda, sendo a acusada pessoa com 27 anos de idade, que possui todas as condições de sustentar a si e à família exercendo outra atividade ou mesmo o comércio, desde que lícito”.

Condenação

O magistrado condenou a ré à pena de dois anos de reclusão e multa, em regime inicial aberto, mais multa, substituída a pena privativa de liberdade por um salário mínimo nacional, em favor de entidade a ser designada posteriormente, além de multa, no mesmo valor.

Tribunal de Justiça

Para o Desembargador Constantino Lisboa de Azevedo, relator da apelação na 4ª Câmara Criminal do TJRS, “não se está a exigir que ela feche seu estabelecimento comercial e deixe de trabalhar, mas que trabalhe como qualquer cidadão, de forma lícita e digna, comercializando produtos originais, mesmo obtendo lucro menor”. A condenação mostrou-se inevitável, afirmou o magistrado.

O Desembargador-relator citou diversas decisões anteriores do colegiado no sentido da necessidade de comprovação “de perigo atual que não permita alternativa” para a prática do delito, a não ser a prática do ilícito, o que não ocorre no caso, considerou.

“Para caracterização do estado de necessidade, deve estar presente o requisito da inevitabilidade da conduta lesiva”, conforme o acórdão do Proc. 70023806169, lembrou o Desembargador Constantino.

Os Desembargadores José Eugênio Tedesco, que presidiu o julgamento ocorrido em 19/2/09, e Gaspar Marques Batista, acompanharam o voto do relator.

Proc. 70028265478

Publicado no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul



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VALTER MACIEL FILHO
OAB/RS 30.586

quinta-feira, 5 de março de 2009

Lei de Exucuções Penais - Lei n° 7.210

Lei das Execuções Penais - Lei n° 7.210


LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984.


TEXTO INTEGRAL - CLIQUE AQUI
http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L7210.htm

LEI DE TÓXICOS - Lei n° 11.343

Esta Lei REVOGOU a Lei no 6.368, de 21 de outubro de 1976, e a Lei no 10.409, de 11 de janeiro de 2002.


Clique aqui e saiba como ficou:
_________________________________________
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11343.htm
_________________________________________

Legislação Brasileira e Súmulas do STJ

Constituição Federal
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm

Legislação por Assunto
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/assunto.htm

Lei das Execuções Penais
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Emendas Constitucionais
http://www.presidenciadarepublica.gov.br/legislacao/emendas/

Leis Delegadas
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/Ldl/Quadro_LDL.htm

Códigos
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Codigos/quadro_cod.htm

Decretos
http://www.presidenciadarepublica.gov.br/legislacao/decretos/

Leis Ordinárias
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/_Lei-Ordinaria.htm

Medidas Provisórias
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Leis Complementares
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Pesquisa por legislação
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Consituição Estadual do Estado do Rio Grande do Sul
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Legislação do Estado do Rio Grande do Sul
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Súmulas do Superior Tribunal de Justiça (STJ)

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quarta-feira, 4 de março de 2009

ACUSAÇÃO INFUNDADA DE FURTO GERA INDENIZAÇÃO

Acusação infundada de furto gera indenização

Faxineira contratada para realizar limpeza de uma padaria não recebe o pagamento pelo serviço e ainda é acusada de furto. A acusação sem provas resultou em dano moral reconhecido pela Justiça. O valor da indenização, fixado em R$ 3 mil, foi aumentado para R$ 5 mil pela 9ª Câmara Cível do TJRS.

A autora sustentou que após realizar o serviço de limpeza em Padaria não recebeu a contraprestação que lhe era devida. No outro dia retornou ao local e recebeu resposta de que o serviço não seria pago, pois o local ainda estava sujo. Disse que a ré foi até outro estabelecimento comercial onde também fazia faxina e a acusou de ter furtado uma nota de R$ 100,00 constrangendo-a em frente a outras pessoas.

A ré, nora da dona da padaria, alegou não caber a indenização que não houve ofensa ou acusação proferida contra a autora. Além do mais, pleiteou a redução da quantia, caso não fosse retirada a indenização.

Para o relator, o Desembargador Odone Sanguiné, a acusação da ré não tinha base fática plausível. “Causando à demandante enormes transtornos, já que foi submetida à situação de constrangimento em seu ambiente de trabalho, quando a ré compareceu fazendo acusações infundadas”. Mencionou que testemunhas narraram a situação vexatória e constrangedora a que foi submetida a autora da ação na frente de outras pessoas, sendo “inegável a conduta imprudente da ré”.

Quanto a quantia indenizatória, o Desembargador acredita que o valor de R$ 3 mil arbitrado pelo juiz de 1° Grau deve ser majorado para R$ 5 mil.

A sessão foi realizada em 18/2. Acompanharam o voto as Desembargadoras Iris Helena Medeiros Nogueira e Marilene Bonzanini Bernardini e esta notícia foi publicada no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Proc.70025909326


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VALTER MACIEL FILHO
OAB/RS 30.586




Acórdão

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACUSAÇÃO DE PRÁTICA DE FURTO DE UMA NOTA DE r$ 100,00. DANO MORAL CONFIGURADO.
1. RESPONSABILIDADE CIVIL. 1.1 A imputação de crime a outrem, desprovida de elementos fáticos que ensejassem a acusação, caracteriza ato ilícito, por abuso de direito, nos termos do artigo 187 do atual Código Civil.
1.2 A matéria vertida nos autos diz com pedido de indenização por danos morais em virtude de suposta acusação de prática de crime de furto proferida pela ré contra a autora. Na casuística, a autora se desincumbiu do seu ônus, nos termos do art. 333, I, do CPC, porquanto comprovou a acusação pretensamente sofrida.
1.3 Com efeito, é inegável a conduta imprudente e temerária adotada pela ré, que, sem qualquer substrato probatório mínimo, baseada tão-somente em indícios ou suposições (já que a autora havia permanecido, no local em que desaparecido o dinheiro, por algum tempo, sozinha), acusou a demandante de ter-lhe subtraído quantia em dinheiro. Portanto, nesses lindes, tenho que a situação vertida nos autos exorbita os limites do mero exercício regular de direito, caracterizando ato ilícito, nos termos do artigo 187 do atual Código Civil. A meu ver, a acusação efetivada pela ré não tinha base fática plausível, causando à demandante enormes transtornos, visto que, foi submetida à situação de constrangimento em seu ambiente de trabalho, quando aí compareceu a ré fazendo acusações infundadas acerca da prática de crime de furto. Quanto ao dano, tenho que esse se mostra evidente, in re ipsa, independendo de maior prova a respeito de sua ocorrência.
2. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. De acordo com a Súmula nº. 326 do E. STJ, na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca.
APELAÇÃO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
APELO DA RÉ DESPROVIDO. UNÂNIME.

Apelação Cível

Nona Câmara Cível
Nº 70025909326

Comarca de Porto Alegre
KARIN SUSANE SCHERER

APELANTE/APELADO
MARIA EUNICE PINTO DA TRINDADE

APELANTE/APELADO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo da autora e negar provimento ao recurso da ré.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, as eminentes Senhoras Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (Presidente e Revisora) e Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi.
Porto Alegre, 18 de fevereiro de 2009.

DES. ODONE SANGUINÉ,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Odone Sanguiné (RELATOR)
1. Trata-se de apelações cíveis interpostas por KARIN SUSANE SCHERER e MARIA EUNICE PINTO DA TRINDADE, insatisfeitas com a decisão das fls. 66-67v prolatada nos autos da ação indenizatória por danos morais que MARIA EUNICE PINTO DA TRINDADE move em face de KARIN SUSANE SCHERER, que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a ré ao pagamento de (i) R$ 3.000,00 a título de indenização por dano moral, corrigidos monetariamente pelo IGP-M a partir da decisão e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação; (ii) custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 500,00.

Inconformadas as partes apelam.

2. KARIN SUSANE SCHERER, em suas razões recursais (fls. 70-85), requer, preliminarmente, a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita. Quanto ao mérito, argumenta que (i) inexiste ato ilícito praticado contra a autora; (ii) apenas se negou ao pagamento do serviço à autora porque essa não o realizou da maneira conforme combinado – de modo que não subsiste o dever de indenizar; (ii) não houve ofensa verbal ou acusação alguma proferida contra a autora, a qual não se desincumbiu do ônus que lhe atribui o art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil. Alternativamente, pugna pela redução do quantum indenizatório. Quanto à verba sucumbencial, afirma que houve sucumbência recíproca, já que o pedido da autora não fora atendido completamente, ante o fato de o magistrado ter fixado verba indenizatória (R$ 3.000,00) em valor inferior àquele pleiteado na exordial (R$ 19.000,00).

3. MARIA EUNICE PINTO DA TRINDADE, a seu turno (fls. 88-96), postula (i) majoração do valor arbitrado a título de dano moral; e (ii) majoração da verba honorária para 20% sobre o valor da condenação.

4. Intimadas (fl. 98), somente MARIA EUNICE PINTO DA TRINDADE apresentou contrarrazões ao recurso interposto (fls. 101-106).

5. Subiram os autos e, distribuídos, vieram conclusos.

É o relatório.
VOTOS
Des. Odone Sanguiné (RELATOR)
Eminentes Colegas:

6. Cuida-se de apelações cíveis interpostas por KARIN SUSANE SCHERER e MARIA EUNICE PINTO DA TRINDADE, insatisfeitas com a decisão das fls. 66-67v prolatada nos autos da ação indenizatória por danos morais que MARIA EUNICE PINTO DA TRINDADE move em face de KARIN SUSANE SCHERER, que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a ré ao pagamento de (i) R$ 3.000,00 a título de indenização por dano moral, corrigidos monetariamente pelo IGP-M a partir da decisão e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação; (ii) custas processuais e honorários advocatícios.

7. Ao que se depreende da inicial (fls. 02-07), a autora teria sido contratada pela demandada para prestar serviços de limpeza no estabelecimento comercial (padaria) de propriedade da sogra dessa última. No entanto, após realizar o serviço, no dia e hora combinados, não recebeu a contraprestação que lhe era devida. Alega a autora que fora embora do local e que retornara em outro dia para receber o que lhe era devido, recebendo, contudo, como resposta, que o valor não lhe seria entregue porque o serviço não havia sido feito (já que o local permanecia sujo) e porque havia desaparecido uma nota de R$ 100,00. Assevera a demandante que a ré compareceu no outro estabelecimento comercial, em que também prestava serviços de faxina, acusando-a de furto e constrangendo-a em frente a outras pessoas.

Examine-se.

8. Trata-se de ação indenizatória, por meio da qual a autora postula a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais em decorrência de injusta acusação da prática de crime de furto a ela imputada.

9. É cediço que a imputação de crime a outrem, desprovida de elementos fáticos que ensejem a acusação, caracteriza ato ilícito, por abuso de direito, nos termos do artigo 187 do atual Código Civil.

10. Pois bem, da análise do conjunto probatório trazido aos autos, mormente no que se refere aos depoimentos testemunhais, entendo que resta comprovado o dano moral alegado pela autora.

11. Na casuística, a parte demandante se desincumbiu do seu ônus, nos termos do art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil, porquanto comprovou a imputação, feita contra ela, da prática de crime de furto.

12. Ora, é fato incontroverso nos autos que (i) a autora esteve no estabelecimento comercial de propriedade da sogra da demandada, onde prestou serviços de limpeza; (ii) a demandante não recebeu a remuneração que lhe seria devida pela prestação do serviço; e (iii) que a ré esteve no outro local em que também a autora trabalhava para averiguar acerca do desaparecimento de uma nota de R$ 100,00 (cem reais).

13. Pois bem. A autora afirma na inicial que a ré, ao chegar no local em que estava trabalhando (Padaria Porto-Alegrense), e, na frente das demais pessoas, acusou-a, descontroladamente, de ter furtado uma nota de R$ 100,00 de seu estabelecimento comercial enquanto realizava o serviço de faxina (fl. 03).

14. E é isso que deflui dos depoimentos testemunhais das fls. 62-64 – já que se comprovou que a demandante foi submetida, por conduta imputável à ré, à situação vexatória e constrangedora na presença de outras pessoas.

15. A testemunha Manoel Luís Parente Martins Meixedo (fl. 62), em seu depoimento testemunhal, respondeu à pergunta “O senhor sabe alguma coisa sobre a dona Karin ter acusado a dona Maria Eunice de ter subtraído uma quantia em dinheiro da padaria dela”, da seguinte maneira: “Eu ia passando na ocasião na padaria e a senhora estava, as duas estavam conversando, não foi comigo, ‘trabalhou na minha padaria e desapareceu 100’”. Em outro momento, afirma que a ré “falou que estava faltando 100 reais” e, ao que tudo indica, a despeito de não ter sido “desrespeitosa” a maneira com que se dirigiu à autora, “falou meio alto”.

Ao mesmo tempo em que assevera que não fora utilizado o termo “furto”, ressalta que a demandada relacionou a autora ao desaparecimento de uma quantia em dinheiro do local em que essa prestou os serviços de limpeza (fl. 63).

16. A testemunha Eronilda Fernandes da Costa (fls. 63-64), também, ratificando o depoimento acima, destaca que “logo em seguida que ela (a ré) foi embora o seu Manuel foi na cozinha, na confeitaria, e comentou que aquela senhora tinha ido lá para dizer que a Eunice (autora) tinha pegado (sic) 100 reais [...]”.

17. Com efeito, é inegável a conduta imprudente e temerária adotada pela ré, que, sem qualquer substrato probatório mínimo, baseada tão-somente em indícios ou suposições (já que a autora havia permanecido, no local em que desaparecido o dinheiro, por algum tempo, sozinha), acusou a demandante de ter-lhe subtraído quantia em dinheiro.

18. Portanto, nesses lindes, tenho que a situação vertida nos autos exorbita os limites do mero exercício regular de direito, caracterizando ato ilícito, nos termos do artigo 187 do atual Código Civil. A meu ver, a acusação efetivada pela ré não tinha base fática plausível, causando à demandante enormes transtornos, visto que, foi submetida à situação de constrangimento em seu ambiente de trabalho, quando aí compareceu a ré fazendo acusações infundadas acerca da prática de crime de furto. Quanto ao dano, tenho que esse se mostra evidente, in re ipsa, independendo de maior prova a respeito de sua ocorrência.

19. Assim sendo, tenho que deva ser reconhecida a responsabilidade da demandada para com o ocorrido, em razão do seu abuso de direito.

20. Nesse sentido, aliás, assim já se manifestou esta Corte, consoante os seguintes julgados: Apelação Cível Nº 70023891773, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 19/11/2008 e Apelação Cível Nº 70017579079, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Íris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 28/12/2006.

Dito isso, passo à análise do quantum indenizatório.

b) Quantum Indenizatório

21. A parte ré, em seu apelo, pede que seja minorado o quantum indenizatório. A autora, por seu turno, pugna pela majoração deste.

Pois bem, a indenização por dano moral deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado.

22. Nesta linha, entendo que a condição econômica das partes, a repercussão do fato, a conduta do agente – análise de culpa ou dolo – devem ser perquiridos para a justa dosimetria do valor indenizatório.

No caso, a autora litiga sob o pálio da Assistência Judiciária Gratuita (fl. 13), e, mediante acusação infundada da prática de crime de furto de uma nota de R$ 100, 00 (cem reais) foi submetida, em decorrência da conduta imprudente da ré, à situação vexatória e humilhante perante seus colegas de trabalho.

A ré, por seu turno, ao que indica a prova dos autos, atua como responsável pelo estabelecimento comercial de propriedade de sua sogra (fls. 29-34).

23. Assim sendo, ponderados tais critérios objetivos, tenho que o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) arbitrado pelo juízo a quo deve ser majorado para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que tenho por suficiente para atenuar as conseqüências causadas à honra do ofendido, não significando um enriquecimento sem causa, punindo o responsável e dissuadindo-o da prática de novo atentado, valor este acompanhado dos devidos consectários legais, nos termos a seguir.

24. Inicialmente, quanto aos juros moratórios, na hipótese de reparação por dano moral, entendo cabível a incidência deste consectário a partir da fixação do quantum, ou seja, a contar do julgamento no qual foi arbitrado o valor da condenação, no caso, quando do acórdão. Destaco que tal posicionamento não afronta o verbete da Súmula nº 54 do STJ, ao contrário, harmoniza-se com o seu entendimento, segundo o qual a indenização por danos morais deve ser fixada de forma eqüitativa.

25. No que tange à correção monetária, o termo inicial da contagem deve ser a data do julgamento. Dessa forma, além de se ter o quantum indenizatório justo e atualizado, evita-se que a morosidade processual ou a demora do ofendido em ingressar com a correspondente ação indenizatória gere prejuízos à parte demandada, sobretudo, em razão do caráter pecuniário da condenação (STJ: REsp 618940 / MA; Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro; Terceira Turma; julgado em 24/05/2005; DJ 08.08.2005 p. 302.). Entendimento recentemente consolidado no verbete nº. 362 da Súmula do Eg. Superior Tribunal de Justiça, verbis: “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”.

c) Dano moral e sucumbência recíproca

26. A parte ré, em suas razões de apelo, requer que sejam redistribuídos os ônus sucumbenciais, afirmando que houve sucumbência recíproca, já que o pedido da autora não fora atendido completamente, ante o fato de o magistrado ter fixado verba indenizatória (R$ 3.000,00) em valor inferior àquele pleiteado na exordial (R$ 19.000,00).

Pois bem, não merece guarida a alegação da parte ré: embora a autora tenha requerido a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 19.000,00 (fl. 07), o acolhimento da pretensão indenizatória em montante inferior ao pleiteado na inicial não implica sucumbência recíproca.

Nesse sentido, a jurisprudência é pacífica, havendo inclusive súmula do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria. A Súmula nº. 326 proveniente dessa Corte menciona que “na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca.” O posicionamento do Egrégio Tribunal é acolhido por esta Colenda Câmara, conforme se depreende da análise da Apelação Cível nº 70023023518, de minha relatoria e a de nº 70020453056, de relatoria do Des. Tasso Caubi Soares Delabary.

27. Dessa forma, ainda que o autor tenha pleiteado indenização em montante superior ao que lhe foi reconhecido em sentença, alterado neste acórdão, não há de se falar em sucumbência parcial pelo não acolhimento do pedido, motivo pelo qual devem os ônus sucumbenciais, arbitrados pelo magistrado de primeiro grau, serem mantidos, inclusive no que diz respeito ao valor fixado a título de verba honorária, condenando-se a ré a arcar com a totalidade das custas processuais, bem como honorários à parte autora, no montante de R$ 500,00 (quinhentos reais).

28. Destarte, ante o exposto, voto no sentido de (i) dar parcial provimento ao apelo da parte autora, para majorar o quantum indenizatório; e (ii) negar provimento ao apelo da ré.



Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (PRESIDENTE E REVISORA) - De acordo.
Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi - De acordo.

DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA - Presidente - Apelação Cível nº 70025909326, Comarca de Porto Alegre: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ. UNÂNIME."


Julgador(a) de 1º Grau: DRA ADRIANA DA SILVA RIBEIRO

terça-feira, 3 de março de 2009

JUIZ DETERMINA QUE RÉU CONDENADO CUMPRA PENA DE IMEDIATO

Juiz determina que réu condenado cumpra pena de imediato

O Juiz da Comarca de Carazinho, Orlando Faccini Neto, determinou hoje (3/3) que réu condenado a dois anos e seis meses de reclusão passe a cumprir a pena imediatamente, mesmo que o processo ainda não tenha transitado em julgado e, portanto, com possibilidade de recurso.

A decisão tem entendimento diverso do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), que em 5/2, por sete votos a quatro, concedeu habeas corpus (HC 84087) permitindo que condenado em Minas Gerais por tentativa de homicídio duplamente qualificado fique em liberdade até se esgotarem as apelações nos Tribunais Superiores.

O Juiz Faccini Neto, no texto em que decidiu, critica o posicionamento do STF, pois entende que dá causa a “desprestígio” das decisões de magistrados e tribunais de instâncias ordinárias.

Explicou que a utilização de recursos indefinidos ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao STF já não buscam mudar a conclusão sobre a prova e a autoria do crime, mas apenas verificar se houve eventual contrariedade à Constituição ou lei federal.

“De maneira que sem nenhum arranhão ao princípio da não-culpabilidade ou da presunção da inocência, a partir da decisão condenatória do Tribunal de Justiça, penso, pode-se partir para a execução da pena”.

Argumenta que o habeas concedido pelo STF não tem força vinculante, em vista de que não alcança os quesitos impostos pela Constituição Federal (maioria qualificada de dois terços de Ministros e ‘reiteradas decisões sobre matéria constitucional’).
Países europeus privilegiam decisões de 1º e 2º Graus

Para o magistrado, ainda que a presunção da inocência seja “princípio constitucional de alta envergadura”, não deve ser o único a ser levado em conta nas decisões penais. Citou os casos de diversos países, como Alemanha, Inglaterra, Portugal, onde se presta eficácia às decisões de primeiro e segundo grau, permitindo-se a execução da pena tão logo sentenciado o réu.

“Então é importante, também, verificar-se como se passam as coisas em nações nas quais por certo não se cogita do uso de porretes, como sintoma de vingança, apontado, data venia, como infeliz figura de retórica, pelo Ministro relator [Eros Grau] do HC 84087”.

Abaixo, a íntegra da decisão.

Vistos.

Cuida a espécie de análise sobre potencial execução de pena, aplicada em sentença de primeiro grau, e mantida à unanimidade pelo Tribunal de Justiça deste Estado, diante do manejo, pelo condenado, de Recurso Especial, que, diga-se logo, teve o seu seguimento negado, ensejando, assim, interposição de recurso de agravo, pendente de julgamento junto ao Superior Tribunal de Justiça.

Não me constrangeria em, seguindo decisão já padronizada nesta comarca, determinar, neste quadro, a imediata execução da pena.

As razões, para tanto, sempre as dei nos termos que seguem, in verbis :

O Supremo Tribunal Federal tem firmado posicionamento no sentido de que a imediata execução da pena, embora a pendência de recursos Especial ou Extraordinário, não viola o princípio da presunção da inocência, de modo que viável a formação do PEC provisório.

Cito:

Ementa: Habeas corpus. Constitucional. Processual penal. Execução provisória da pena. Pendência de julgamento dos Recursos especial e extraordinário. Ofensa ao princípio da presunção da inocência: não-ocorrência.

Precedentes.
1. A jurisprudência dessa Corte é no sentido de que a pendência de recurso especial ou extraordinário não impede a execução imediata da pena, considerando que eles não tem efeito suspensivo, são excepcionais, sem que isso implique em ofensa ao princípio da presunção da inocência.
2. Habeas corpus indeferido.

Decisão: por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de habeas corpus, cassada a liminar; vencido o Ministro Marco Aurélio, Presidente-Relator. Relator para o acórdão o Ministro Menezes Direito. (HC 90645/PE STF. 1ª Turma. Rel. Min. Menezes Direito. Julgado em 11/09/2007).

No informativo 400 do STF constou decisão de relatoria da Min. Ellen Gracie no mesmo sentido:

A Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado a 8 anos de reclusão pela prática dos crimes previstos nos arts. 12 e 14 da Lei 6.368/76. Na espécie, o Tribunal de Justiça local mantivera a sentença condenatória, elevando a pena, tendo contra ela o paciente interposto recursos especial e extraordinário, que, inadmitidos, ensejaram a interposição de agravo de instrumento. Entendeu-se que, exauridas as instâncias ordinárias, sendo incabível o reexame de fatos e provas, bem como a concessão, no caso, de efeito suspensivo aos recursos especial e extraordinário interpostos, ter-se-ia a execução provisória da pena, nos termos do art. 637, do CPP, não havendo que se falar em afronta ao princípio da não-culpabilidade, que apenas revela que a culpa não se presume (CPP, art. 637: "O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoado pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença."). Ressaltou-se que entendimento diverso implicaria atribuir ao condenado o direito de fixar o início da execução de sua condenação, o que refletiria na contagem do prazo da pretensão da prescrição punitiva e da prescrição executória. Salientou-se, ademais, a inexistência de norma legal expressa que estabeleça ser o trânsito em julgado condição para o início da execução de condenação.(HC 85886/RJ, Rel. Min. Ellen Gracie, 6.9.2005. e HC-85886)

Destarte, embora ausente o trânsito em julgado em relação a ré, considerando que já foi formado o PEC provisório, deve dar início à execução da pena, não obstante o agravo pendente, que não possui efeito suspensivo.

Entretanto, aqui se trata da primeira situação que se apresenta ulteriormente ao julgamento do HC 84.078-7, pelo Supremo Tribunal Federal, em que a Corte, por sete votos a quatro, e alterando jurisprudência antes sólida, vedou fosse executada a pena, antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Apenas para confirmar que deveras o alvitre preponderante era diverso do que agora encampado, cito a ementa da decisão profligada, neste HC, exarada pelo Superior Tribunal de Justiça, e que dizia :

É assente a diretriz pretoriana no sentido de que o princípio constitucional da não-culpabilidade não inibe a constrição do status libertatis do réu, com condenação confirmada em segundo grau, porquanto os recursos especial e extraordinário são, em regra, desprovidos de efeito suspensivo.

Precedente do STF e do STJ.

Repita-se, por sete votos a quatro, houve o Supremo Tribunal Federal de alterar esse entendimento, de que aos recursos especial e extraordinário não se haveria de conferir o efeito suspensivo.

De plano, uma vez que já adianto que concluirei de modo diverso e, assim, afastar-me-ei do precedente, é bom consignar que tal decisão, lançada em sede de Habeas Corpus, não ostenta eficácia vinculante.

E nem poderia, parece, ser alvo de súmula vinculativa, a uma porquanto a maioria qualificada de dois terços dos Ministros, de que trata o artigo 103-A da Constituição Federal, não foi atingida e, a duas, pois esse mesmo dispositivo constitucional revela admissível a edição de súmula vinculante apenas quando houver “ reiteradas decisões sobre matéria constitucional ” e, insisto nisso, essa decisão é efetivamente a que veio em direção oposta às anteriormente adotadas pelo mesmo Tribunal, não sinalizando, destarte, a sedimentação necessária para o estabelecimento de vinculação.

Enfim, talvez aqui um aspecto de disfunção de nosso sistema, pois parece claro que em chegando ao Supremo Tribunal Federal o condenado lograria obter a seu favor uma decisão, mas que, pontualmente – e digo com a tranqüilidade de quem segue os precedentes já estabelecidos, mesmo quando para tal vai ressalvada expressamente minha posição pessoal – está em nível de menor importância com a preservação das decisões judiciais, e, a meu ver, com a efetividade da justiça penal.

De anotar-se que, no caso presente, o recurso especial manejado pelo condenado não foi conhecido. Noutras palavras, assentou-se o seu descabimento. Portanto, sequer há pendência de seu julgamento. Há, sim, recurso de agravo, cujo escopo não é revolver a matéria decidida na sentença condenatória e no acórdão que a confirmou. O objetivo é, apenas, dar trânsito a um recurso já tido, numa análise primeira, como impróprio.

Sabe-se que da decisão deste agravo poderá o condenado irresignar-se por outra via recursal, e assim por diante, ficando a seu alvedrio, por completo, a deflagração do cumprimento de sua pena.

Não se pode abordar o tema olvidando-se a técnica dos recursos.

A Constituição Federal estabelece que compete ao Supremo Tribunal Federal julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida a) contrariar dispositivo da Constituição Federal, b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, c) julgar válida lei ou ato de governo local,contestado em face da Constituição.

O Recurso Especial tem cabimento junto ao Superior Tribunal de Justiça quando a decisão recorrida a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhe vigência, b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal, c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

São, portanto, recursos aos quais se reduz, constitucionalmente, a pertinência à matéria de direito.

Em sede de direito criminal, e essa premissa para mim é relevante, como regra são interpostos tais recursos com permissivos, respectivamente, para o extraordinário, no artigo 102, III, a, da Constituição Federal, isto é, com a tese de que a decisão contrariou dispositivo constitucional e, no especial, com base no artigo 105, III, a, da Carta, vale dizer, com a alegação de que a decisão recorrida contrariou a lei federal ou negou-lhe vigência.

Em tais recursos, pois, o que é fato, ou seja, a apreciação a respeito do arcabouço probatório produzido no processo, e que, geralmente, conduz à conclusão a respeito da materialidade e autoria do crime, esses temas não são devolvidos à apreciação, seja do Supremo Tribunal Federal, quando julga o recurso extraordinário, seja do Superior Tribunal de Justiça, quando julga o recurso especial.

A limitação no que é o efeito devolutivo desses recursos enseja, intuitivamente, a inexistência de efeito suspensivo.

Que, por sua vez, é afastado pela lei de regência - Lei nº 8038/90.

Explico.

Uma vez assentada a matéria de fato, pela instância ordinária – sentença e acórdão -, no ponto ter-se-á a impossibilidade de discussão de tais questões nos recursos especial e extraordinário.
Esses, como visto, aludirão à eventual contrariedade da decisão à Constituição Federal ou à lei federal. E aqui, a presunção de que se deve cogitar é a de que a decisão recorrida, emanada de um Tribunal, esteja afinada com a lei e a Constituição.

A presunção, repito, embora nem todos os ministros do Supremo Tribunal Federal a consagrem, a presunção é a de que os juízes e os Tribunais cumpram a lei e a Constituição.

De maneira que sem nenhum arranhão ao princípio da não-culpabilidade ou da presunção de inocência, a partir da decisão condenatória do Tribunal de Justiça, penso, pode-se partir para a execução da pena.

Refira-se, ainda, que de todos os problemas oriundos dessa decisão do Supremo Tribunal Federal, em minha compreensão, o de maior gravidade é o que concerne ao desprestígio às decisões das instâncias ordinárias, isto é, dos magistrados e Tribunais.

Sequer abordarei o problema conjuntural de morosidade, que está também no Supremo Tribunal Federal – para ilustrar, o HC 84078-7 lá tramita há mais de três anos e notícia sobre o julgamento do recurso extraordinário alusivo ao caso não se tem -, pelo qual o distanciamento temporal demasiado entre o fato criminoso praticado e a execução da pena levarão a um aguçado sentimento de impunidade e, ainda, do ponto de vista do condenado, a uma sanção quase sem serventia – no caso do HC em referência tem-se tentativa de homicídio ocorrida há simplesmente dez anos.....

Importa sim, todavia, tratar mais da suposta violação à presunção de inocência, que é princípio constitucional da mais alta envergadura, porém não é o único princípio constitucional a nortear as decisões penais.

A presunção de inocência se vê mitigada a partir da primeira decisão condenatória, ainda que do juiz de primeiro grau.

Se a sentença condenatória de primeira instância não abalasse a presunção de inocência, ou seja, se diante do ato jurídico sentença condenatória e o artigo 5º, LVII da Constituição Federal, o que se assentasse fosse a inocência, e não a culpabilidade afirmada pelo juiz, a ausência de recurso a essa mesma sentença não poderia ensejar a execução da pena.

Prolatada que seja, entretanto, a sentença condenatória, se nada for feito pelo condenado, isto é, mantido o estado de inércia, o que se tem é a produção do efeito dessa mesma sentença, que afirmava a culpabilidade e determinava a execução da pena.

Sabe-se, desde a doutrina do processo civil, que a coisa julgada se apresenta como uma qualidade dos efeitos da sentença, agregando-lhe a imutabilidade.

Noutras palavras, a execução da pena é efeito da sentença, e não do advento do trânsito em julgado, embora seja indiscutivelmente acertado que, ao recorrer no nível da ampla devolutividade, por meio de apelação - recurso que, este sim, devolve amplamente a apreciação de tudo quanto relacionado, ao Tribunal de Justiça -, faça-o o condenado em liberdade, salvo nas hipóteses legais de segregação cautelar, como é curial.

Em seu voto, o Ministro Eros Grau aludiu a que seria melhor que cada qual utilizasse o seu porrete, se não adotado o alvitre de que apenas a última manifestação judicial far-se-ia hábil a ensejar a execução da pena.

A respeito das funções que se deve estabelecer à pena, mormente à privativa de liberdade, já tive ocasião de escrever e aqui cito :Fins da Pena e a Contextualização do Direito Penal no Sistema de Tutela dos Direitos Fundamentais

Consoante afirma Carvalho (2001, P. 125), a justificação do uso da violência, da imposição de sanções pelo poder público, é um dos questionamentos mais clássicos da filosofia e da teoria do direito penal.

A sanção penal representa, pois, em si mesma, a restrição ou privação ( ainda que não integral ), de direitos fundamentais. Sua função ( ou funções ), em conseqüência, deve se mostrar hábil não só a empreender sua legitimação, como também a revelar seja, tanto quanto possível, proporcional ao fato criminoso cometido, pois, do contrário, a sua ilegitimidade se revelará patente.

Não obstante, as controvérsias a respeito das funções da pena, mesmo na quadra atual, não findaram. Com enfoques diversos e partindo de variados pressupostos, ainda hoje não se pode afirmar tenha a doutrina encontrado porto seguro a respeito desse importante tema.
Ver-se-á, a seguir, de modo sintético, as principais correntes que buscaram fundamentar a reação estatal ao desvio, sem se olvidar que os fins, os escopos da pena, isto é, aquilo que se pretende com a sua previsão legal ( em abstrato ) e a sua imposição ( em concreto ) confundem-se, mesmo, com os objetivos do próprio direito penal.

A função retributiva

As denominadas teorias absolutas enxergam na pena um castigo, um mal que se impõe àquele que comete um delito.

Assim a define, com efeito, Basileu Garcia (1956, p. 405): “Pena, como sintetiza Cuello Calón, é o sofrimento imposto pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado de infração penal”.
O fundamento desse entendimento foi elaborado por Kant ( 1798, apud Figueiredo Dias, 1999, p. 92 ) e Hegel ( 1821, apud Figueiredo Dias, 1999, p. 92 ), ainda que cada qual o enfocasse com visão própria. O primeiro, como se sabe, concebeu a pena como imperativo categórico, ou seja, afirmando-a como uma exigência incondicional de justiça, livre de considerações utilitárias. Nesta perspectiva, a pena esgotar-se-ia em si mesma, sem que fosse lícito atribuir-lhe outra função que não punir o delinqüente.

Para Hegel, a seu turno, a pena se justifica em vista da necessidade de se restabelecer a concordância da vontade geral, expressa na norma violada, com a vontade especial e particular do criminoso. Noutros termos, se o fato criminoso se coloca como a negação pelo criminoso da vontade geral, a pena se apresenta como a negação dessa negação.

Não obstante a função retributiva tenha sido alvo de acaloradas críticas, deve-se reconhecer que sua acolhida permite seja estabelecido um limite de garantia para o condenado.

Assim, nas palavras de Mir Puig (2002, p. 51)
no se podia castigar más allá de la gravedad del delito cometido, ni siquiera por consideraciones preventivas, porque la dignidad humana se oponía a que el individuo fuese utilizado como instrumento de consecución de fines sociales de prevencion a él trascendentes.

Com efeito, encarada a pena como retribuição ao fato – e sempre ao fato, jamais ao modo de conduzir-se ou às características pessoais[1] – cometido, tem-se que deverá, necessariamente, ser mantido nexo de proporção entre a privação de direito que representará a sanção e a violação – também de um direito – que o crime representou. Garante-se, destarte, ao criminoso, que a reação estatal não será desproporcional.

A função preventiva

Ao se atribuir à pena privativa de liberdade a função retributiva enfoca-se o passado, vale dizer, a realização do fato criminoso. Já aqui, na função preventiva, o que se tem em mira é o futuro, no sentido de que seja evitada a prática de novos delitos.

Sob dois ângulos se coloca a função preventiva. O primeiro deles versa a prevenção geral, no que se concebe a pena privativa de liberdade como meio de inibir a criminalidade latente na sociedade.

Neste sentido, é emblemática a advertência de Bentham (2002, p. 23) :

O modo geral de fazer prevenir os crimes é declarar a pena que lhe corresponde e fazê-la executar, o que, na acepção geral e verdadeira serve de exemplo. O castigo em que o réu padece é um painel em que todo homem pode ver o retrato do que lhe teria acontecido, se infelizmente incorresse no mesmo crime. Este é o fim principal das penas, é o escudo com que elas se defendem.

Para tal enforque, portanto, a sanção imposta ao delinqüente atua como fator inibidor da reprodução da criminalidade.

A prevenção especial, de outro lado, propende a evitar que o próprio delinqüente persevere na prática criminosa, neutralizando-o. Ocorre que a prevenção especial, se adotada como diretriz teórica a fundamentar a pena privativa de liberdade, traria o intolerável resultado de diversos fatos graves resultarem impunes, quando não mais haja perigo de que o criminoso reincida.

Fornece Mir Puig (2002, p. 58) o seguinte exemplo

en relacción a los delinqüentes nazis – v.gr: vigilantes de campos de concentración – juzgados años después de concluída la guerra. Pese a la gravedad de sus cargos, bajo la nueva situacción política dejaron, em su mayor parte, de encerrar peligrosidad criminal (...). No obstante - se dije – no deja de repeler al sentido de justicia dejar impunes tales hechos.

Afora isso, a afirmação de que a pena possui o escopo preventivo consagra a “coisificação” do condenado, tornando-o instrumento de objetivos estatais, no que se tem violada sua dignidade[2].

Ademais, a experiência revela que a aplicação da pena privativa de liberdade não atua como fator inibidor do aumento da delinqüência e, se bem que ínsita à própria idéia de sociedade, a diminuição da criminalidade a patamares aceitáveis não pode deixar de, na lição de Molina ( 2002, p. 399)

resolver as situações carenciais criminógenas, procurando uma socialização proveitosa de acordo com os objetivos sociais. Educação e socialização, casa, trabalho, bem-estar social e qualidade de vida são os âmbitos essenciais para uma prevenção primária, que opera sempre a médio e longo prazos e se dirige a todos os cidadãos.

Relegar-se ao olvido tal perspectiva tornará mais agudo o que se tem verificado, ou seja, não obstante ampliado o número de punições, ainda assim, tem-se elevado as taxas da criminalidade.

Teoria Eclética

Dentre os diversos autores que unem à pena privativa de liberdade os escopos preventivos e retributivos, destaca-se Roxin ( 1973, apud Mir Puig, 2002, p. 64 ), em cuja teoria dá-se a cada uma dessas funções diverso momento de incidência. Daí que, para esse autor, a cominação em abstrato das penas atua no nível da prevenção geral, de modo a coibir a prática de fatos criminosos. Na aplicação da pena ao caso concreto tem-se a confirmação da seriedade da cominação em abstrato, razão por que, segundo Mir Puig (2002, p. 65) “la función de la pena en el momento judicial es, pues, confirmación de la prevención general hasta el limite maximo de la culpabilidad ( es decir, de la retribuición)”.

Por fim, na fase de execução da pena ter-se-ia a realização da função de prevenção especial, de forma que se pretende a ressocialização do delinqüente, evitando que volte a cometer crimes.
Não se pode olvidar, todavia, que o objetivo por último mencionado, qual seja o da prevenção especial em decorrência da ressocialização, tem-se revelado frustrante. Não só os altos índices de reincidência o demonstram, mas também a constatação de que se afigura paradoxal pretender embutir valores da vida em sociedade justamente no cárcere, quando se está alijado do contato social.

No ponto, explica Reale Junior ( 2002, v.2.p. 7) que

a prisão vem a constituir uma estrutura social diversa da existente na sociedade livre. Tem, portanto, regras próprias, códigos de honra específicos do meio carcerário, formas de assunção de poder real caracteristicamente suas, construindo-se uma subcultura carcerária, como anotam Muñoz Conde e Garcia Áran, que facilita o surgimento de ´máfias carcerárias´, em tudo se contrapondo a qualquer processo de acomodação às normas prevalecentes na vida social[3].
Agregue-se que a pretendida introdução de novos valores àqueles que são submetidos à pena, mormente a privativa de liberdade, muita vez pode militar contra o direito fundamental de se auto-determinar, inclusive politicamente.

Com efeito, a demonstrar como tal perspectiva pode resultar em abusos e mostrar-se totalitária, calha citar o alvitre de Zdravomíslov (1970, p. 292), em obra de direito penal da falecida União Soviética.

El fin de la corrección y de la reducación del delinqüente consiste en cambiar, por medio de la pena, su sicología, en desarraigar de su consciência los vestígios del pasado, bajo cuya influencia se cometió el delito, y em fomentar em la persona el sentimiento de respeto a las leyes y a las reglas de la convivencia socialista.

Nem é preciso dizer que, na quadra atual, não poderia ir a tanto o poder estatal. Há que se respeitar diferenças, sem a pretensão de modificá-las, mormente por intermédio da coação exercida pela pena.

Função reafirmadora do ordenamento

Estabelecer à pena privativa de liberdade o objetivo de revitalização do ordenamento violado é o que sustentam os adeptos dessa corrente.

De tal perspectiva, cujo maior expoente é Jakobs (2003), extrai-se que a pena destina-se à proteção da validade da norma. Assim, se com o delito o criminoso se rebela contra a norma e mostra a configuração de mundo que almeja - frustrando a expectativa social de que todos atuarão conforme as leis -, a pena reafirma, a seu turno, que a configuração de sociedade desenhada pelas normas é a que deve prevalecer.

Nas palavras de Jakobs (2003, p. 35)

O fim da pena que acabo de esboçar se denomina atualmente prevenção geral positiva : prevenção geral porque pretende-se produzir um efeito em todos os cidadãos; positiva, porque esse efeito não se pretende que consista em medo diante da pena, e sim em uma tranqüilização no sentido de que a norma está vigente, de que a vigência da norma, que se viu afetada pelo fato, voltou a ser fortalecida pela pena.

Sem a pena, pois, frustrar-se-iam as expectativas normativas e as normas deixariam de ser respeitadas. Ou, como leciona Reale Junior (2002, p. 55), com a pena
reafirma-se positivamente o direito, trazendo um reforço às convicções jurídicas fundamentais, pois se há uma expectativa de que as instituições elementares funcionem, a prática do delito constitui uma decepção desta expectativa, e a pena tem uma função ´exercitar a confiança na norma´, dar frente ao delito maior confiança na norma a quem nela confia. Dessa forma, diz Jakobs, a pena se volta para exercitar a fidelidade ao direito.

Destarte, a imposição da pena faz demonstrar que a configuração de mundo pretendida pelo criminoso não se sobrepuja àquela revelada pelo ordenamento jurídico; o reforço do sistema normativo, por meio da sanção, ademais, restabelece na comunidade a confiança que se fez abalada com a prática do crime e indica que a proteção espraiada aos bens jurídicos pelo ordenamento penal se faz hígida.

Um Novo Olhar Sobre os Fins da Pena

Não há como, no atual estágio doutrinário, afirmar-se, sem incorrer em equívoco, que tal ou qual sistema penal adotou, irrestritamente, alguma das teses a respeito dos escopos que se busca alcançar com a aplicação de pena. De certo modo, não mais se cogitam de sistemas puros, havendo, apenas, nuances mais ou menos destacadas, sem que disso resulte desprezo ao desenvolvimento histórico que, no ponto, logrou-se atingir.

De tudo quanto foi dito, ainda que resumidamente, acerca das diversas correntes explicativas dos objetivos da pena, em especial a privativa de liberdade, viu-se, então, que o escopo da prevenção negativa, em qualquer de seus enfoques, por tornar o condenado instrumento de fins estatais, é aquele que menos se afaz a uma ordem jurídica democrática[4].

Partindo do suposto de que o problema criminal envolve diversos atores, parece que a resolução sobre os fins da pena depende, primordialmente, do sujeito que se tenha em consideração. Noutras palavras, a pena privativa de liberdade possui função diversa, variada, a depender de cada um dos agentes que compõem o problema criminal.

Assim, para o delinqüente, surge inequivocamente como uma retribuição a seu ato, e, por ser retributiva, haverá de ser proporcional à infração. Para a sociedade, a pena se mostra como restauradora do ordenamento violado, validando-o e preservando-o, na linha do preconizado por Jakobs (2003, p. 35). Por fim, a pena privativa de liberdade tem importante função para o ofendido, para a vítima do delito ou as pessoas mais diretamente ligadas a ela, visto que o crime produz inequívocos sentimentos de vingança, que apenas são aplacados caso o Estado chame a si a solução do conflito e o faça de maneira adequada.

Tal enfoque resvala na lição de Winnicott ( 1999, p. 128), segundo o qual : “uma das funções da lei é proteger o criminoso contra essa mesma vingança inconsciente e, portanto, cega”.
Também Ferrajoli (2002, p. 268), a tal respeito, consigna que na ausência das penas, a reação informal e selvagem do ofendido ou de forças sociais ligadas a ele poderia advir e é “o impedimento deste mal, do qual seria vítima o réu, ou, pior ainda, pessoas solidárias ao mesmo, que representa, eu acredito, o segundo e fundamental objetivo justificante do direito penal”.

Em última análise, assegurando a validez do ordenamento jurídico, a pena se mostra instrumento de tutela de direitos fundamentais, consagrados como bens jurídicos pelas normas penais; sendo fator dissuasório de reações punitivas informais, resguarda direitos fundamentais do ofensor.
Assim, ainda que com divergência pontual, parece acertada a observação de Ferrajoli (2002, p. 270), para quem se mostra evidente :

a ´necessidade política´ do direito penal enquanto instrumento de tutela dos direitos fundamentais, os quais lhe definem, normativamente, os âmbitos e os limites, enquanto bens que não se justifica ofender nem com os delitos nem com as punições[5].

Neste mesmo sentido, acentuam Dolcini e Marinucci (1994, p. 195, grifos no original) que
a Constituição traça um programa de acção para todos os poderes da República, visando garantir a integridade e o crescimento de múltiplos bens individuais e coletivos. A realização de um tal programa deve ser assegurada através dos mais variados instrumentos, normativos e de aplicação, à disposição dis poderes públicos. Para o legislador, este dever de garantia dos bens constitucionais concretiza-se também na utilização, se indispensável, da pena.

Dessa ligação entre o Direito Penal - como mecanismo estatal de proteção - e os direitos fundamentais - como sistema de direitos em tal ordem relevante a ponto de justificar e requerer tutela pelo mais agudo dos ramos jurídicos – é que surge a proibição de insuficiência ( ou de proteção deficiente ), a ser analisada adiante.

(......)

Do registro, parece oportuno assentar que a fixação de um interregno largo entre o fato criminoso e o momento da efetivação da atuação estatal colima em dissuadir, sob todos os aspectos, e em qualquer nível teórico que se busque justificá-la, a necessidade de punição.
Então é importante, também, verificar-se como se passam as coisas em nações nas quais por certo não se cogita do uso de porretes, como sintoma de vingança, apontado, data venia, como infeliz figura de retórica, pelo Ministro relator do HC 84087.

Em notável trabalho publicado no sítio do Ministério Público Federal, os Procuradores Regionais da República Luiza Cristina Fonseca Frischeisen e Mônica Nicida Garcia, de maneira eloquente apontaram como, em diversos países do mundo, se trata da temática.

Cito :

“ Na Inglaterra, por exemplo, em 2003, o “Criminal Justice Act” inseriu modificações significativas no Processo Penal Britânico tratando de vários temas, incluindo os poderes da polícia, o sistema de recursos e o sistema do júri.

O “Criminal Justice Act 2003” representou restrição substancial ao procedimento de liberdade provisória, abolindo a possibilidade de recursos à “High Court ” versando sobre o mérito da possibilidade de liberação do condenado sob fiança até o julgamento de todos os recursos, deixando a matéria quase que exclusivamente sob competência da “Crown Court”.

Especificamente quanto à fiança, o “Act” de 2003 reformou o antigo “Bail Act 1976”. A partir de 2003, o condenado a crimes relacionados a drogas da “Classe A” (como a cocaína) perdia o direito de liberdade provisória sob fiança, ou seja, deveria aguardar preso o julgamento de seu recurso às Cortes superiores.

Hoje, tem-se que a regra é aguardar o julgamento dos recursos já cumprindo a pena, a menos que a lei garanta a liberdade pela fiança ”.

E tocando no que se depreende de maior importância, concluem :

“ conforme se percebe, mesmo no país em que se originaram os direitos do cidadão contra os abusos do Estado, o princípio da presunção da inocência não é interpretado de forma absoluta, respeitando-se, assim, as decisões das primeiras instâncias ”.

O panorama é semelhante no Canadá.

Um dos elementos que fazem parte do “código constitucional” canadense é a Carta de Direitos e Liberdades que dispõe na seção 11, “d” que qualquer pessoa acusada de uma ofensa tem o direito de ser presumida inocente até a prova da culpa de acordo com a lei 53 US Code, Subsetion b, Section 3582, Subchapter D, Chapter 227, Part II, Title 18: “b) Effect of Finality of Judgment.--Notwithstanding the fact that a sentence to imprisonment can subsequently be--(1) modified pursuant to the provisions of subsection (c); (2) corrected pursuant to the provisions of rule35 of the Federal Rules of Criminal Procedure and section 3742; or (3) appealed and modified, if outsidethe guideline range, pursuant to the provisions of section 3742; a judgment of conviction that includes such a sentence constitutes a final judgment for all other purposes.

A idéia é cara para a Suprema Corte do país que trata o princípio como a “linha de ouro” que tece a teia do processo criminal.

Como dizem as autoras :

“ Mesmo assim, a força da presunção da inocência não impede o início do cumprimento da sentença logo depois de exarada a sentença. O Código Criminal dispõe que uma corte deve, o mais rápido possível depois que o autor do fato for considerado culpado, conduzir os procedimentos para que as sentença seja imposta.

Na Suprema Corte, o julgamento do caso R. v. Pearson, [1992] 3 S.C.R. 665, consignou que a presunção da inocência não significa, “é claro”, a impossibilidade de prisão antes de um acusado antes que seja estabelecida a culpa além de alguma dúvida.

Após a sentença de primeiro grau, a pena é automaticamente executada, tendo como exceção a possibilidade de fiança que deve preencher requisitos rígidos previstos no Criminal Code, válido em todo o território Canadense ”.

Na Alemanha, não obstante a relevância da presunção da inocência, diante de uma sentença penal condenatória, o Código de Processo Alemão (Strafprozessordnung) prevê efeito suspensivo apenas para alguns recursos. Assim, têm efeito suspensivo a apelação (§316 StPO) e a revisão (§343 StPO). Todavia não obstam a execução imediata a interposição do pedido de restauração da situação anterior (§47 StPO), da reclamação (§307 StPO), e da revisão criminal (§360 StPO).

Não há dúvida, porém, e o Tribunal Constitucional assim tem decidido, que nenhum recurso aos Tribunais Superiores tem efeito suspensivo.

Em Portugal, o princípio da presunção da inocência está previsto na Constituição Portuguesa de 1976 dentre os Direitos, Liberdades e Garantias Pessoais. Estabelece o nº 2 do art. 32 que “todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.”

Como referem as autoras citadas, porém :

“ A garantia dessa presunção, contudo, não é óbice ao Princípio da “Execução Imediata” que vigora no direito português ”.

Com efeito, diz Maia Gonçalves que “radica esse princípio na necessidade de assegurar a exemplaridade da condenação, satisfazendo-se, assim, os fins de prevenção especial e geral das penas e porque seria desumano retardar o cumprimento, pois isso poderia até, em alguns casos, implicar uma penalização suplementar. Este princípio, embora não expressamente formulado no Código, contém nele vários afloramentos, máxime nos arts. 469º e 485º, nº 4 e no instituto da contumácia e pode admitir restrições radicadas em razões humanitárias”

O Código de Processo Penal Português estabelece em seu art. 408 o efeito suspensivo dos recursos, contudo, já é certo na jurisprudência que esta suspensão dos efeitos não se aplica ao Tribunal Constitucional.

Nesse sentido decidiu o Tribunal da Relação de Lisboa que: “I – o art. 408 do CPP refere-se a recursos ordinários da ordem jurídica comum com o regime previsto no mesmo diploma, não se aplicando o respectivo efeito suspensivo aos recursos para o Tribunal Constitucional. II – Assim, após a prolação pelo STJ [Supremo Tribunal de Justiça] de acórdão condenatório em pena de prisão, o arguido preso preventivamente passará à situação de cumprimento de pena, ainda que haja sido interposto recurso para o Tribunal Constitucional.

O Tribunal Constitucional Português interpreta o princípio da presunção de inocência com restrições. Admite que o mandamento constitucional que garante esse direito remeteu à legislação ordinária a forma de exercê-lo. As decisões desta mais alta corte portuguesa dispõem que tratar a presunção de inocência de forma absoluta corresponderia a impedir a execução de qualquer medida privativa de liberdade, mesmo as cautelares.

Confira-se:

“(...)Da literalidade de tal preceito resulta que o Diploma Básico não impõe, quanto àquela excepção ao direito à liberdade e segurança, que o acto judicial determinativo da privação da liberdade tenha de assumir característica de definitividade, pelo que se há de concluir que, neste particular, o legislador constituinte remeteu para a normação ordinária a questão da imediata exequibilidade das sentenças judiciais condenatórias impositoras de pena de prisão ou da aplicação de uma medida de segurança. ( GONÇALVES, Manuel Lopes Maia. Código de Processo Penal. Anotado e Comentado. Coimbra:Almedina, 2001, 12ª ed., pág.867. Acórdão da Relação de Lisboa de 26 de outubro de 1999, Coletânea de Jurisprudência XXIV, tomo 4, pág. 160 ).

A doutrina portuguesa, aliás, no que parece ter absoluta razão, concebe a idéia da graduação na formação da coisa julgada, na perspectiva antes abordada de que, solvidas que sejam as questões de fato, pelas instâncias ordinárias, e, limitada a devolução dos demais recursos à matéria jurídica, sobre cuja aplicação o que se há de presumir é o acerto dos tribunais e juízes de primeiro grau, ter-se-ia nenhuma peia à execução do que decidido, pelos órgãos judiciais competentes.

Vale transcrever Maia Gonçalves, uma vez mais :

“ Por outro lado, a presunção de inocência que é constitucionalmente definida pelo nº 2 do artigo 32º até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, não pode ser chamada à colação para efeitos de daí se extrair a impossibilidade de execução da pena de prisão determinada por uma sentença que se considere como provisoriamente transitada em julgado. E provisoriamente, note-se, pois que está unicamente sujeita à condição resolutiva de alteração da decisão tomada em sede recursória, decisão essa que confirmou as questões de facto ou de direito que levaram ao juízo constante da sentença impositora de pena de prisão e que, por motivos ligados a uma actuação, considerada pelo tribunal de recurso como manifestamente obstativa ao cumprimento do julgado por este tribunal,levou o mesmo a extrair traslado e a determinar que o processo fosse remetido ao tribunal recorrido, a fim de aí prosseguirem seus termos”.

A Espanha é outro dos países em que, muito embora seja a presunção de inocência um direito constitucionalmente garantido, vigora o princípio da efetividade das decisões condenatórias.

No texto publicado no sítio do Ministério Público Federal, sobre o caso espanhol, lê-se :

“ seguindo este princípio, se o acusado foi condenado em processo em que lhe foi oferecido contraditório e ampla defesa, em que foram cotejadas todas as provas, observado está o princípio da presunção da inocência. A sentença condenatória é, deste modo, plenamente executável, mesmo que outros recursos estejam em trâmite ”.

neste sentido, assim já se pronunciou o Tribunal Constitucional espanhol:

“ la efectividad de las sanciones no entra en colisión con la presunción de inocencia; la propia legitimidad de la potestad sancionatoria, y la sujeción a un procedimiento contradictorio, abierto al juego de la prueba 2. Asimismo, todos tienen derecho al juez ordinario predeterminado por la ley, a la defensa y a la asistencia de letrado, a ser informados de la acusación formulada contra ellos, a un proceso público sin dilaciones indebidas y con todas las garantías, a utilizar los medios de prueba pertinentes para su defensa, a no declarar contra sí mismos, a no confesarse culpables y a la presunción de inocencia. (...)”

Ressalte-se, ainda, que o artigo 983, do Código de Processo Penal Espanhol admite até mesmo a possibilidade da continuação da prisão daquele que foi absolvido em instância inferior e contra o qual tramita recurso com efeito suspensivo em instância superior.

A Embaixada dos Estados Unidos da América emitiu documento, em resposta à indagação feita pelo Subprocurador-Geral da República Vagner Gonçalves, dando conta de que, naquele país :
“ há grande respeito, pelo que poderia comparar com o sistema brasileiro, com o juízo de primeiro grau, com o cumprimento imediato das decisões proferidas pelos juízes. (...) Após a prolação da sentença o condenado passa imediatamente a cumpri-la, sendo possível, no entanto, pleitear sua revisão, conforme previsão do US Code, título 18, parte 2, capítulo 235, &3742, review of a sentence, baseada nos requisitos que a lei estabelece, sem que, no entanto, se obste ao início do cumprimento da pena ”.

E alude, ainda, à circunstância de que : “ a diferença fundamental no sistema norte americano é a presença de regramento específico dando plena eficácia às decisões de primeiro grau ”.
Percebe-se, destarte, que em nenhum dos sistemas jurídicos estrangeiros mencionados cogita-se de imposição de violência, jurídica ou por meio de porretes, à concessão de eficácia às decisões de primeiro e segundo graus, balizadas, todavia, de maneira acertada em nosso ordenamento, pela perspectiva de que, para apelar, isto é, para manejar o recurso que carrega consigo ampla devolutividade, entregando ao órgão recursal toda a matéria decidida inicialmente, não haverá o inconformado de ser recolhido à prisão.

Esse o equilíbrio do sistema, que não descura de nenhum dos valores constitucionais em cotejo e que não lê, da Constituição Federal, apenas o artigo 5º, LVII, como se nada mais lhe prestasse obséquio.

Também Douglas Fischer, em texto publicado no sítio já apontado, indica que as limitações cognitivas dos recursos especial e extraordinário determinam que, em sua pendência, se cumpra o que decidido em sentença, confirmada em grau de apelação.

Cito trecho de seu trabalho :

“ Hipóteses de cabimento de recurso especial e de recurso extraordinário.

A Constituição é bastante clara – e muito restrita – às hipóteses de cabimento dos recursos especial e extraordinário. Nenhuma delas envolve diretamente qualquer matéria afeta à culpa/inocência do condenado. No máximo, indiretamente, como regra geral. E mesmo que se diga que envolva diretamente o tema (a ensejar eventual recurso de natureza extraordinária), há, na própria Constituição, meios muito mais eficazes e amplos para a tutela desses direitos eventualmente violados, que precisam ser considerados para uma compreensão sistêmica da ordem vigente.

Na senda do art. 102, III, CF/88, caberá recurso extraordinário nas hipóteses de a decisão: a) contrariar dispositivo da Constituição; b)declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válidae ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; e d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Sistemicamente não se compreende como a limitadíssima amplitude das discussões possíveis no âmbito dos recursos retronominados poderiam afetar o princípio constitucional da presunção de inocência. Em nossa compreensão, tal conclusão pode ser extraída apenas da leitura isolada do comando constitucional (mesmo que extraiam todos os efeitos que dele irradiam como norma constitucional que é) de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, LVII).

7. O reconhecimento – explícito - pelo Supremo Tribunal Federal de que o recurso extraordinário não se presta a discussões atinentes à culpa/inocência (lato sensu) do agente criminoso.

O Supremo Tribunal Federal sempre foi muito firme acerca de ser absolutamente limitado o espectro dentro do qual se apresenta possível debater determinadas questões em sede de recurso extraordinário, chegando ao ponto de reconhecer, explicitamente, que “a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que as alegações de afronta aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, entre outros, configuram ofensa reflexa à Constituição da República. (Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 452.001-PB, Relatora Ministra Cármen Lúcia, 1ª Turma, unânime, julgado em 19.06.2007, publicado no DJ em 03.08.2007). Não debateremos aqui a pertinência ou não de tais conclusões. Mas é importante não descurar que esse é o entendimento vigorante no âmbito da Suprema Corte.

É de se ver, ainda, que a restrição de possibilidade de recursos extraordinários hodiernamente é maior ainda em face da introdução na ordem constitucional de mais um requisito de admissibilidade dos recursos extraordinários: a repercussão geral (§ 3º do art. 102, CF).

No julgamento da Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 664-567-2-RS (Tribunal Pleno, julgado em 18.06.2007, DJ em 06.09.2007), em que se restaram definidos os critérios para aferição da repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal firmou algumas premissas que merecem destaque:
a) A partir da EC 45, de 30 de dezembro de 2004 – que incluiu o § 3º no art. 102 da Constituição -, passou a integrar o núcleo comum da disciplina constitucional do recurso extraordinário a exigência da repercussão geral da questão constitucional;
b) Não tem maior relevo a circunstância de a Lei nº 11.418/06, que regulamentou esse dispositivo, ter alterado apenas texto do Código de Processo Civil, tendo em vista o caráter geral das normas nele inseridas;
c) Não há falar em uma imanente repercussão geral de todo recurso extraordinário em matéria criminal, porque em jogo, de regra, a liberdade de locomoção: o Recurso Extraordinário busca preservar a autoridade e a uniformidade da inteligência da Constituição, o que se reforça com a necessidade de repercussão geral das questões constitucionais nele versadas, assim entendidas aquelas que "ultrapassem os interesses subjetivos da causa" (art. 543-A, § 1º, CPC, incluído pela Lei nº 11.418/06);
d) Para obviar a ameaça ou lesão à liberdade de locomoção – por remotas que sejam -, há sempre a garantia constitucional do habeas corpus (CF, art. 5º, LXVIII);
e) a exigência da demonstração formal e fundamentada, no recurso extraordinário, da repercussão geral das questões constitucionais discutidas só incide quando a intimação do acórdão recorrido tenha ocorrido a partir de 03 de maio de 2007, data da publicação da Emenda Regimental n. 21, de 30 de abril de 2007.

Não é de hoje que, fática, teórica e juridicamente (por interpretação constitucional do STF e também em face de expressa disposição normativa), o habeas corpus perdeu sua função original (Pontes de Miranda, História e prática do Habeas Corpus. Rio de Janeiro, Borsoi, 1962, 4.ed, p.105), servindo para as mais diversas questões, não só para também atacar ilegalidades ou abusos de poder, como também para as hipóteses em que a argüição esteja relacionada à observância do devido processo legal (lato sensu).

Sintetizadas na ementa do julgado retromencionado (e que refletem o que foi decidido pela Corte Suprema), as palavras do Ministro-Relator, Sepúlveda Pertence, são deveras elucidativas ao assentar que não se pode “falar em uma imanente repercussão geral de todo recurso extraordinário em matéria criminal”, pois o recurso extraordinário “busca preservar a autoridade e a uniformidade da inteligência da Constituição, o que se reforça com a necessidade de repercussão geral das questões constitucionais nele versadas, assim entendidas aquelas que "ultrapassem os interesses subjetivos da causa". Na seqüência, vê-se o expresso reconhecimento – já vigorante há muito naquela Corte, se ainda não percebido por muitos – que, na pendência de admissibilidade ou análise de recurso extraordinário, para “obviar a ameaça ou lesão à liberdade de locomoção - por remotas que sejam -, há sempre a garantia constitucional do habeas corpus (CF, art. 5º, LXVIII)”.

Na senda de Claus-Wilhelm Canaris (Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. 3 ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p. 273), tem razão Juarez Freitas (A Interpretação Sistemática do Direito. 4 ed. rev. e amp.São Paulo: Malheiros, 2004, p. 70) ao expor que “cada preceito deve ser visto como parte viva do todo, eis que apenas no exame de conjunto tende a ser melhor equacionado qualquer caso, quando se almeja uma bemfundamentada hierarquização tópica dos princípios tidos como proeminentes”, na medida em que, conclui, “interpretar uma norma é interpretar o sistema inteiro, pois qualquer exegese comete, direta ou obliquamente, uma aplicação da totalidade do Direito, para além de sua dimensão textual”. Em outras palavras, também suas, “ainda quando se esteja examinando, em aparência, uma norma isolada, esta só poderá ser bem compreendida na relação mútua com as demais”.

Insiste-se, reportando-se ao precedente anterior do Supremo Tribunal Federal: por remotas que existam eventuais ilegalidades (ou até muitas, o que se diz apenas para fins de argumentação) praticadas pelos tribunais e juízes inferiores, são elas remediadas – pronta e eficazmente (até mais que via recursal própria) – por intermédio do habeas corpus (previsto constitucionalmente), que pode – é cediço – ser concedido inclusive ex officio pelos tribunais e em sede liminar (procedimento também decorrente de criação jurisprudencial) e de forma substitutiva aos próprios recursos, mesmo que na pendência de seus exames.

Por mais paradoxal que possa parecer, mas é, em nosso sentir, dessa compreensão sistêmica do ordenamento constitucional que se extraem taisconclusões: a cognição permitida em hábeas corpus é até muito mais ampla do que aquela possível nos recursos extraordinário e/ou especial (embora naturalmente restrita para ambos).

No que se refere às provas, a limitação nos recursos extraordinários e nos habeas corpus é idêntica, mas no writ não se exige qualquer prequestionamento de matéria, muito menos eventual repercussão geral.

Em se tratando de suposta violação de normas infraconstitucionais (que se traduzam na inobservância do devido processo legal), o writ permite o exame pela Corte Suprema da matéria, o que se mostra inviável em sede de recurso extraordinário” .

Como se sabe, no campo da filosofia, desde Demócrito se tem afirmado que o mundo, tal qual o apreendemos pelos sentidos, não é o mundo real. Todas as nossas impressões e percepções sensoriais são causadas pela ação das coisas sobre os nossos sentidos, de maneira que, o real, nesta perspectiva, é o que permanece quando ninguém está lá.

Noutras palavras, como diz Giannetti, no seu O Auto Engano, o real é “ tudo aquilo que continuaria existindo se não houvesse filósofos e seres dotados de sentidos para apreendê-los ” ( 1998, p. 77 ).

A busca de objetividade pressupõe, portanto, na perspectiva cartesiana, que o observador atue isento das noções e juízos que o circundam, livre, pois, de suas particularidades, como memórias, desejos e sensações, algo que, deveras, se faz impossível, sobretudo depois da análise freudiana e da demonstração de que há algo que igualmente nos move e que não conhecemos, porquanto permanece oculto : o inconsciente.

O fato é que, como diz Giannetti : “ vivemos imersos em subjetividade ” ( 1997, p. 87 ). Ou seja, pretender que o intérprete faça abstração de suas pré-compreensões de mundo, para chegar ao que deveras é – ao que seria real -, mostra-se tarefa impossível. Dela resultaria, por exemplo, a aferição de que uma obra de arte, uma pintura, corresponde apenas à tinta lançada sobre madeira ou tela, pois a beleza – a estética em si – não é de ordem objetiva.

Na forma como expõe Gadamer, tal busca da ontologia da imagem – ou do ser – resulta em que torna-se duvidosa a primazia do quadro pintado sobre madeira, que faz parte de um acervo de pinturas e que corresponde à consciência estética. Ao contrário, o quadro guarda uma relação indissolúvel com o seu mundo ( 2004, 205 ).

E com o mundo de quem o vê – poder-se-ia acrescentar.

Deste modo, há de se compreender, numa primeira análise, a atividade de interpretação constitucional, máxime no que concerne aos direitos fundamentais.

Não mais se cogita, portanto, daquilo que se convencionou denominar de “ sentido verdadeiro da norma ”, o qual deveria ser buscado pelo intérprete valendo-se das técnicas de interpretação.
A lição de Maximiliano, segundo o qual compete ao intérprete “ descobrir e fixar o sentido verdadeiro da regra positiva ” ( 1996, p. 01 ) não mais se afaz aos modernos estudos de hermenêutica.

É que se deve estabelecer distinção no procedimento do intérprete diante do objeto que lhe incumba interpretar. Noutras palavras, como explana Coelho :
enquanto as leis físicas, como sínteses de uma dada experiência, exprimem só o que é, aquilo que efetivamente acontece, as leis morais não recebem as suas verdades das condutas que intentam regular, porque não expressam aquilo que é, mas aquilo que deve ser ( 2002, p. 53 – grifos no original ).

Segundo Streck :

as palavras da lei não são unívocas; são, sim, plurívocas, questão que o próprio Kelsen já detectara de há muito. Por isto, é necessário dizer que, pelo processo interpretativo, não decorre a descoberta do unívoco ou do ´correto sentido´, mas, sim, a produção de um sentido originado de um processo de compreensão, onde o sujeito, a partir de uma situação hermenêutica, faz uma fusão de sentidos a partir de sua historicidade. Não há interpretação sem relação social ( 2001, p. 19 ).

Dentro dessa idéia, tem-se que a norma, deveras, nasce a partir de sua interpretação mesma. Quer dizer : não há como desgarrar-se de qualquer tentativa de se aplicar a norma, uma sua interpretação, que pode variar, todavia, na medida em que variam os casos concretos, fazendo pertinente imagem já clássica, de que a norma é a partitura e o intérprete o músico, que, sempre com os olhos na partitura, pode propiciar uma bela execução ou uma peça enfadonha.

Ainda Coelho, neste mesmo enfoque, esclarece que, por essa razão, autores como Peres Luño “ chegam a dizer que a norma jurídica não é o pressuposto, mas o resultado da interpretação ” ( 2002, 62 ). De modo que se pode assinalar que as regras de direito só entram em vigor no momento da sua aplicação, porque só então é que se aperfeiçoam os modelos jurídicos, pela fusão dialética do que neles é norma e situação normada, preceito e realidade ( COELHO, 2002, p. 64 ).

As objeções postas à eventual subjetividade decorrente desse processo de interpretação das normas não são diversas daquelas que, por exemplo, se poderia fazer à atividade do magistrado na análise dos fatos que lhe são colocados a julgamento ( ou dos fragmentos do fato todo ), quando, igualmente, atua jungido às suas condicionantes, às suas circunstâncias e, se delas alhear-se, já aí não será mais Juiz, não será mais o que é, enfim, simplesmente deixará de ser.

Se não for admitida a margem de subjetividade existente na análise judicial – dos fatos e normas -; se não for admitido que o julgamento - que depende da prova testemunhal, por exemplo -, condiciona-se, ele, também, à subjetividade da testemunha, que traz do fato a sua leitura, que se prende inexoravelmente a seu modo de ver o mundo; se não se admite, enfim, que o conforto da segurança escapa aos paradigmas do pós-modernismo, o contrário disso é a crença de que a verdade real se faz possível. De que há verdade e não verdades, e, em nome dessa verdade, praticar atos que, a história demonstra, muitas vezes campearam para o arbítrio.

A atividade do intérprete, pois, entremostra-se impregnada por suas contingências, envolta em suas compreensões e pré-compreensões, enfim, atua como pessoa e não como máquina.
Isso, contudo, em nada retira a legitimidade de seu proceder, pelo fato de que os homens ainda são mais confiáveis do que os computadores. A carga de subjetividade, portanto, inerente a tudo que é humano, não retira a validade dentro do sistema, do atuar hermenêutico.

Por outro lado, esse enriquecimento de perspectiva amplia a atividade interpretativa, gerando-lhe um consectário maior que é o de impor a necessidade de esmiuçar racionalmente o seu trabalho. Como diz Coelho, então, acentua-se para o intérprete o dever de prestar contas de seu trabalho interpretativo, o qual :
para ser legítimo, há de ser racional, objetivo e controlável, pois nada se coaduna menos com a idéia de Estado de Direito do que a figura de um oráculo despótico e iluminado, que esteja acima da lei e dos critérios usuais de interpretação ( 2002, p. 68 ).

Por isso que os critérios de interpretação deverão ser controláveis, assegurando a racionalidade de seu desenvolvimento e a formulação de explicações por parte de seus formuladores.
Daí que surgem os princípios de interpretação vocacionados especificamente ao Direito Constitucional, tais como o princípio da supremacia da Constituição, o princípio de presunção de constitucionalidade das leis e atos do poder público, o princípio de interpretação conforme a Constituição, os princípios da unidade e da efetividade e o princípio da proporcionalidade.

À toda evidência que tais conceitos situados no campo da hermenêutica se mostram pertinentes à análise que se empreende, a respeito das determinações constitucionais concernentes ao Direito Penal.

Deveras, cumpre dizer que talvez nenhum outro ramo jurídico traga em seu interior, de modo tão inequívoco, os lineamentos básicos enraizados na Constituição, de forma que, em tal sentido, a configuração do Direito Penal não escapa às opções políticas mais elementares adotadas por uma sociedade, ao constituir-se juridicamente[6][7].

Ou seja, os avanços concernentes à compreensão do processo interpretativo atuam também no que toca às normas constitucionais tendentes à elaboração do sistema penal.
A ordem constitucional, no escopo de ampliar o nível de proteção de certos direitos fundamentais, consagra-os, penalmente, como bens jurídicos, de modo a dedicar-lhes à violação eventualmente imposta, quase sempre, a mais grave das sanções, que é a privação da liberdade.
Assim, a noção de proporcionalidade, na dicção de Ingo Sarlet, não se esgota na categoria de proibição de excesso, já que abrange “ um dever de proteção por parte do Estado, inclusive quanto a agressões de direitos fundamentais provenientes de terceiros ” .

Em tal contexto, ainda, parece inequívoca a assertiva de Sarlet, no sentido de que tanto a proibição de excesso, como a proibição de insuficiência, vinculam os órgãos estatais, guardando ampla relação com a liberdade de conformação do legislador penal.

O princípio da proporcionalidade quer significar que o Estado não deve agir com demasia, tampouco de modo insuficiente na consecução de seus objetivos. Exageros para mais ou para menos configuram irretorquíveis violações ao princípio.

É certo que um redimensionamento da hierarquia dos bens jurídicos se impõe no nível do direito positivo, porquanto não mais parece admissível, por exemplo, que a pena cominada a um homicídio culposo seja inferior à do furto, entre outros casos deveras patológicos que aparecem em nosso Código Penal[8].

Com efeito, a tutela empreendida pelo legislador penal faz parecer que o patrimônio – e a propriedade – são os centros nos quais gravitam todos os interesses e revelam que se relegou ao olvido, ou se minimizou, a proteção dos assim denominados bens de natureza difusa ou transindividual, aos quais, atualmente, se vem ampliando o nível de proteção.

Outrossim, não se pode deixar de concordar que certas infrações devem ser descriminalizadas, mormente aquelas que não afetam bens jurídicos que se afigurem como expressão inequívoca de direitos fundamentais, dentre as quais se pode enumerar o porte de substância entorpecente para uso próprio, as contravenções penais - em sua totalidade -, e os crimes contra a honra – esses porque a seara cível dá conta, sem dúvida, de, por meio de reparação pecuniária, resguardar os interesses do ofendido e, de certo modo, sancionar o ofensor.

No concernente, entretanto, a bens jurídicos que se revelem como consectários dos direitos fundamentais, como a vida, liberdade, propriedade e, ainda, aqueles de ordem transindividual, a exemplo do meio ambiente e da ordem econômica, não se pode afastar a necessidade da tutela penal. Sua ausência ou rebaixamento a níveis irrisórios traria inequívoca pecha de inconstitucionalidade.

Com efeito, segundo Streck :

não há liberdade (absoluta) de conformação legislativa nem mesmo em matéria penal, ainda que a lei venha a descriminalizar condutas consideradas ofensivas a bens fundamentais. Nesse sentido, se de um lado há a proibição de excesso ( übermassverbot ), de outro há a proibição de proteção deficiente ( untermassverbot ). Ou seja, o direito penal não pode ser tratado como se existisse apenas uma espécie de garantismo negativo, a partir da garantia da proibição de excesso. A partir do papel assumido pelo Estado e pelo Direito no Estado Democrático de Direito, o direito penal deve ser (sempre) examinado também a partir de um garantismo positivo, isto é, devemos nos indagar acerca do dever de proteção de determinados bens fundamentais, através do direito penal. Isto significa dizer que, quando o legislador não realiza essa proteção via direito penal, é cabível a utilização da cláusula de ´proibição de proteção deficiente.

Quer dizer, a perspectiva aponta para a preocupação do sistema jurídico com o fato do Estado não proteger suficientemente dado direito fundamental. Assim, a inconstitucionalidade pode decorrer tanto de excesso do Estado, quando determinado ato é desarrazoado, ou desproporcional o resultado do sopesamento entre fins e meios, como também pode advir da proteção insuficiente de um direito fundamental, como quando, por exemplo, se abra mão das sanções penais para proteger determinados bens jurídicos.

Portanto, como explicita Streck (2004, p. 8, grifos no original), há uma via de mão dupla na proteção dos direitos humanos-fundamentais
de um lado o Estado deve protegê-los contra os excessos praticados pelo ´Leviatã´ ( como alguns penalistas liberais-iluministas preferem ainda chamar o Estado nesta quadra da história ); mas, de outro, o Estado deve também protegê-los contra as omissões ( proteção deficiente ), o que significa dizer que há casos em que o Estado não pode abrir mão da proteção através do direito penal para a proteção do direito fundamental .

O sistema penal, assim, está condicionado por preceitos constitucionais que o colocam - como instância mais radical de controle -, no limite possível entre evitar sua banalização - ou seja, a sua utilização como mecanismo de tutela de bens de pouca valia ou em vista de agressões de pouca expressão -, e evitar sua omissão - porquanto haverá, e há, situações em que o acionamento do Direito Penal se mostra imprescindível, sob pena de resultar carente de tutela dado direito fundamental, quando menos o da segurança jurídica e o da manutenção de validade das expectativas normatvas.

Francesco Palazzo denominou de “cláusulas expressas de criminalização” essas manifestações contidas nas constituições, por intermédio das quais se impõe ao legislador ordinário a tipificação de condutas. Em seu entendimento, de tal enfoque se extrai uma visão diversa da corriqueira, acerca do papel da Constituição, contribuindo-se, assim, para
oferecer a imagem de um Estado empenhado e ativo ( inclusive penalmente ) na persecução de maior número de metas propiciadoras de transformação social e da tutela de interesses de dimensões ultraindividual e coletivas, exaltando, continuadamente, o papel instrumental do direito penal com respeito à política criminal, ainda quando sob os auspícios, por assim dizer, da Constituição.

Neste sentido, consoante assenta Díez-Picazo ( 2003, p. 403) “a veces la protección de ciertos derechos fundamentales – y, más en general, de determinados valores constitucionalmente relevantes – sólo puede ser efectiva si se hace por vía penal”.

À idéia de respeito e adequação aos princípios constitucionais não se deve vincular apenas o Poder Legislativo, quando produz a lei, mas também o Poder Judiciário, na tomada de suas decisões.

Não é deveras concebível que, por exemplo, réu julgado e condenado por Júri, órgão de competência constitucional, com decisão mantida por colegiado de Desembargadores, não cumpra a sanção, pela circunstância de que dispõe, ainda, de recursos, nos quais, pela Constituição, só pode discutir se tais decisões precedentes violaram a lei ou a própria Constituição, o que, francamente, não se presume.

Tão ruim quanto seria aqui, unicamente, o argumento de que a demora excessiva no julgamento destes recursos é o que esgota o problema, e não se trata disso, é justificar a idéia oposta com base na verdadeiramente caótica situação de nossos presídios.

É certa, evidente e infeliz a constatação de que novos presídios devem ser construídos.
No caso dos autos, em suma, a condenação proferida em primeiro grau resultou mantida pelo Tribunal de Justiça e, este mesmo, pelo órgão que lhe é próprio, assentou que o Recurso Especial manejado pelo condenado não tem base idônea de cabimento, diante do texto da Constituição Federal, que fixa as hipóteses para o conhecimento de tal recurso.

Ainda que alvitrado o seu cabimento, ainda assim, à assertiva de suposta violação ou negativa de vigência à lei, não se poderia emprestar a presunção de correção, porque, ao revés, presume-se é que as leis e a Constituição foram cumpridas, pelos agentes políticos que julgaram o processo.
O contrário disso é o rompimento da ordem natural das coisas, é a inversão das presunções, é fazer da chamada presunção de inocência não mais uma presunção, mas uma certeza, de que em nosso sistema as instâncias de primeiro e segundo grau não são confiáveis e, portanto, aquilo que decidem só encontrará eficácia se respaldado pelo órgão recursal último, que é o Supremo Tribunal Federal.

Por ter convicção diversa, e louvado nos quatro votos vencidos deste HC 84078, prossigo no alvitre do cabimento da execução provisória e, deste modo, na espécie, determino seja formado incontinenti o processo de execução, para que o condenado dê início ao cumprimento de sua pena.

O processo que exsurgir será apensado no já existente em relação ao condenado, para análise.
Consigno, de modo derradeiro, como obter dictum, porque, a meu ver, tal circunstância é mesmo dispensável, que, no caso concreto, tem-se uma condenação a 02 anos e 06 meses de reclusão, em virtude de o condenado ter utilizado documento falso, nos autos de um processo judicial, a que respondia por receptação; trata-se de condenado que já ostenta condenação a quatro anos de reclusão, por receptação qualificada, essa já imutável, outra condenação pendente de apelação, a sete anos de reclusão, por receptação e adulteração de sinal de veículo, bem como três processos criminais em curso, por fatos de menor gravidade.

Carazinho, 02 de março de 2009.

Orlando Faccini Neto
Juiz de Direito
[1] As ignomínias produzidas por um Direito Penal do autor vieram descritas, lapidarmente, em obra de Muñoz Conde, na qual se desnuda o sistema criminal do nacional-socialismo e a doutrina que o fundamentou. C.f: Edmund Mezger e o Direito Penal de Seu Tempo, Estudos Sobre o Direito Penal do Nacional-Socialismo, 2005.
[2] Como refere Sarlet : “ a dignidade da pessoa humana poderia ser considerada atingida sempre que a pessoa concreta ( o indivíduo ) fosse rebaixado a objeto, a mero instrumento, tratada como uma coisa, em outras palavras, sempre que a pessoa venha a ser descaracterizada e desconsiderada como sujeito de direitos ” ( 2001, p. 58 ).
[3] No campo da literatura o submundo do cárcere, entre outros, vem descrito por Varella, em Estação Carandiru, 1999, Rodrigues, Vidas do Carandiru, 2003, além do insuperável Dostoievski, Recordações da Casa dos Mortos, 1953.
[4] Em verdade, a prevenção negativa confronta com a asserção claríssima de Radbruch, o qual, tratando do problema sob enfoque político – que aqui não será aprofundado – acentua : “ Se é a situação de classe que predominantemente provoca a queda no crime e o uso da pena, deduz-se que não o Direito Penal, mas, de acordo com a palavra de Franz Von Liszt, política social é a melhor política criminal – sendo tarefa duvidosa do direito reparar, contra o criminoso, o que a política social deixou de fazer por ele ” ( 1999, p. 108 ); e conclui : “ pensamento amargo esse, de quantas vezes as custas do processo e da execução, se empregadas antes do crime, teriam bastado para evitá-lo ” ( op. cit., p. 108 ).
[5] Ferrajoli não admite como legítima a função retributiva da pena, no que revelada a divergência pontual apontada no texto. Sustenta, de sua parte, o que se convencionou denominar de utilitarismo reformado, no sentido de que a finalidade da pena seria apenas preventiva, mas, aqui, de prevenção tanto de delitos como de castigos arbitrários, revelando, daí, os limites mínimo e máximo do Direito Penal. A pena, assim, destinar-se-ia a minimizar a violência na sociedade, seja a decorrente do crime, seja a oriunda de reações desproporcionais a ele ( FERRAJOLI, 2002, p. 267/272 ).
[6] Segundo Juarez Cirino dos Santos, por exemplo, as categorias penais não se alheiam de um certo modelo de sociedade de classes, característico dos sistemas capitalistas, dentro do qual o Direito Penal cumpre um papel que melhor é abordado in Direito Penal, A Nova Parte Geral, 1985, p. 21/33. Em suas palavras, por conta disso : “ as condutas criminosas características ( e exclusivas ) das classes dominantes, que vitimizam o conjunto da sociedade ( ou amplos setores da população ), são diferenciadas ao nível da própria incriminação abstrata : ou não são incriminadas, ou são incriminadas de modo impreciso e vago, impedindo a repressão penal ” ( 1985, p. 27 ). E, adiante, defende que para as classes dominantes, a democratização do Direito Penal “ exige uma ampliação da incriminação legal ( tipos penais ) e da criminalização judicial ( aplicação de penas ), por condutas criminosas características de sua posição de classe : o abuso do poder econômico e político. A proposta é amplamente justificada : são os produtores e responsáveis diretos ( além de principais beneficiários ) pelas condições criminógenas da sociedade em que vivemos ” ( 1985, p. 219 ). O tema, todavia, embora sedutor, não haverá de ser aprofundado aqui.
[7] De forma aguda, defendendo um novo paradigma penal, afeto à tutela dos interesses transindividuais, constata Streck que : “ enquanto predominou o interesse liberal-individualista na persecução penal as classes mais abastadas da sociedade brasileira mantiveram-se em situação extremamente confortável em relação aos estratos sociais economicamente mais carentes, pois praticamente as condutas das parcelas mais pobres e exploradas da população não tinham função alguma na reprodução e manutenção de uma determinada ordem sócio-econômica, eram, e ainda em grande parte continuam sendo, destinatárias da aplicação de alguma norma penal incriminadora ”. Disponível em http://www.ihj.org.br/_novo/professores/Professores_16.pdf. Acesso em 11 de janeiro de 2006.
[8] Tema que não será sequer tangenciado, mas que, não obstante, se há de assinalar, é o concernente aos fundamentos de hierarquização dos bens jurídicos no Código Penal. Como se sabe : “ o direito é ideológico na medida em que oculta o sentido das relações estruturais estabelecidas entre os sujeitos, com a finalidade de reproduzir os mecanismos de hegemonia social ” ( BARROSO, 2004, p. 279; WARAT, 1984, P. 17 ). Assim, num certo sentido, a ampliação ou redução dos níveis de tutela penal a certos bens jurídicos não deixa de refletir os interesses, ainda que limitados num dado tempo histórico, das classes dominantes. No mesmo sentido o alvitre de Baratta, segundo o qual o Direito Penal tende a privilegiar os interesses das classes dominantes e a imunizar do processo de criminalização comportamentos socialmente danosos típicos dos indivíduos a elas pertencentes, e ligados funcionalmente à existência da acumulação capitalista ( 2002, p. 165 ).


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VALTER MACIEL FILHO
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